24.2 C
Rio de Janeiro

Sustentabilidade do Caroço de Açaí

Mais lidas

eco21
eco21https://eco21.eco.br
Nossa missão é semear informação ambiental de qualidade.

O crescimento das cidades na região amazônica historicamente se deu de forma desordenada, o que pode ser facilmente observado nos seus municípios mais populosos, como os das regiões metropolitanas. Mesmo no município de Moju distante aproximadamente 127 km da capital Belém, com aproximadamente 79.312 habitantes, localizado no Nordeste paraense, não é diferente. 

Uma situação preocupante e que vem alarmando a população local é o fato de várias famílias estarem construindo suas casas de maneira irregular, utilizando materiais impróprios, tais como resíduos descartados, como aterro de fundação. A maioria dos casos ocorre no entorno de riachos e córregos, intensificando os problemas, pois esses resíduos atingem os lençóis freáticos podendo causar explosões, devido a liberação de gás metano pela decomposição da matéria orgânica. Outro agravante consiste no aumento dos casos de erosão e desabamento, como o recente ocorrido no município de Abaetetuba/PA, onde cerca de 30 casas desabaram o que, de acordo com relatos, ocorreu por conta da utilização de lixo como aterro para nivelamento de terreno. O Sr. Ribeiro em entrevista ao G1 Pará falou que mora cerca de 300 metros da beira do rio, revelou que construiu a própria casa em um terreno aterrado com vários tipos de materiais descartados, entre eles o caroço do açaí no seu estado natural.

De acordo com a pesquisa realizada por Barbosa et al, em 2017, 1º lugar brasileiro em Ciências Sociais Aplicadas na Feira Brasileira de Ciências e Engenharia – FEBRACE 2018 – com o projeto Utilização de lixo na fundação de casas na Amazônia: problema ou solução? Descobriu-se que e possível beneficiar determinados tipos de materiais descartados a fim de utilizá-lo com eficácia na fundação de casas a serem construídas.

A preocupação das pesquisadoras com esta problemática aumentou ainda mais após entrevista realizada nos bairros da cidade de Moju-Pará, onde foi detectada que 65% das residências são aterradas com material impróprio. Além disso, estima-se que 60% da população não sabem dos riscos de se construir uma casa com fundação de lixo, e apenas 40% já ouviram falar do assunto, porém o ignoram. Outro importante dado levantado é o de que 65% da população construíram suas casas sobre o tipo de fundação impropria por não terem dinheiro para comprar o aterro convencional, que e retirado do solo, causando o desmatamento de grandes áreas e a abertura de enormes crateras, como se visualiza na imagem seguinte. Do aterro convencional somente 35% das pessoas utilizaram.

Os dados revelados com a entrevista instigaram o surgimento da pesquisa em questão, através do questionamento principal: Que material de baixo custo e que não agrida o meio ambiente, pode ser reaproveitado e utilizado pela população para fazer as fundações de suas casas de forma segura? Como resposta, a mesma pesquisa verificou que dentre vários materiais o caroço de açaí descartado em média, uma tonelada por dia, somente na cidade de Moju, após beneficiamento obtém propriedades para fins de construção civil.

Isso ocorre, pois, o caroço de açaí, após a sua carbonização, apresenta interessantes propriedades para essa aplicação. Logo, a primeira ideia foi carbonizar o caroço do açaí e triturá-lo, para depois adicionar uma substância ligante que, nesse caso, foi a argila, a qual é muito presente na região, sendo encontrada, principalmente na beira dos córregos e riachos. O papel da argila foi o de solidificar o carvão para que o mesmo viesse a se tornar mais resistente à umidade e ser compactado com o solo para receber fundação de construção. O teste feito apresentou bons resultados, principalmente para fundações de ambientes internos.

A ideia de utilizar o carvão do caroço de açaí para criar um material resistente com fins de construção partiu da leitura do artigo de Silva (1997), em que a mesma discute a possibilidade de utilizar cinzas de carvão na construção civil, uma vez que, segundo ela “A adição de cinzas em argamassas, semelhante aos concretos, tem sido recomendada desde a década de 40. A porcentagem de cinzas volantes utilizada em misturas de argamassas pode variar numa faixa muito larga dependendo do uso e das exigências da obra. As cinzas fornecem maior durabilidade e compactação e menor porosidade e permeabilidade”.

Assim, tem-se que o material resultante da mistura do caroço de açaí com a argila tem ótimas propriedades e serve bem como aterro de fundação de casas. Além disso, com essa aplicação é possível reciclar enormes quantidades de lixo, baratear as construções de moradias da população periférica e de grandes projetos arquitetônicos, diminuir a retirada de aterro (barro) do solo, além de poder ajudar na renda da população, sendo que qualquer pessoa na região tem acesso ao carroço de açaí e a argila, pois são elementos abundantes.

A pesquisa de materiais alternativos vem se desenvolvendo há alguns anos, com essa prática pretende-se encontrar materiais que cause menos impacto e mais economia. Sabe-se que os recursos naturais são finitos, ou seja, em algum momento vão ter fim. A reciclagem, o reaproveitamento, a reutilização são atitudes que podem até não solucionar todos os problemas ambientais adquiridos em séculos de desperdício e despreocupação com a natureza, porém práticas sustentáveis ajudam a amenizar diversas situações, geram emprego e melhoram qualidade de vida de inúmeras pessoas, principalmente em regiões carentes como a região amazônica. 

Ter feito esta descoberta com materiais regionais para resolver problemas regionais, deixou as pesquisadoras radiantes, pois se trata de uma parceria feita pelo projeto de iniciação cientifica realizado entre o Clube de Ciências de Moju e a Escola de Ensino Médio Ernestina Pereira Maia. Percebeu-se a importância de qualquer iniciação, portanto grandes ideias surgem em todo lugar e com divulgação garantida alcançara a devida valorização, como este que foi premiado em 10 categorias na FEBRACE 2018. O projeto tem perspectiva de continuidade, com as propostas de utilizar o material originado na obtenção de tijolos e telhas a partir da queima. Portanto, você jovem, tenha curiosidade, pesquise, trabalhe, solucione. Não e necessário algo mirabolante para você mudar sua realidade e impactar sua cidade ou pais, pequenas atitudes podem fazer grandes diferenças.

In memorian aos professores Rachel Siqueira e Edinaldo Farias

Referencias

Feira Brasileira de Ciências e Engenharia. Resumos FEBRACE 2018; org. por R. D. Lopes, I.  K.Ficheman, E. Saggio. – São Paulo: EPUSP, 2018. p. 219. 

SILVA, N. I. W. et al. Usos de cinzas de carvão na construção civil. I Encontro Nacional sobre Edificações e Comunidades Sustentáveis. Artigo. Canela, RS, 18 a 21 de novembro de 1997.

http://g1.globo.com/pa/para/noticia/2014/01/area-que-desabou-em-abaetetuba-tinha-aterro-irregular-diz-engenheiro.html consultado em 12 de abril de 2018.

Irlene Aracati Marques | Especialista em Gestão, Coordenação e Supervisão Escolar e Diretora da EEEM Professora Ernestina Pereira Maia

*Texto escrito com a colaboração de: Francielly Rodrigues Barbosa | Discente da EEEM Professora Ernestina Pereira Maia e bolsista de Iniciação Científica e de Danielle Siqueira Pereira | Mestra em Educação em Ciências e Coordenadora do clube de Ciências de Moju-Pará

Notícias relacionadas

LEAVE A REPLY

Please enter your comment!
Please enter your name here

Últimas notícias

- Advertisement -spot_img