Willians Ribeiro || Jornalista
Cresce a utilização de instrumentos de precificação de carbono como maneira de lidar com o desafio de limitar as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE). O objetivo dos instrumentos de precificação é incorporar na economia um custo socioambiental, refletindo monetariamente os impactos da mudança do clima e assim permitindo que empresas e consumidores reduzam suas emissões.
Um dos mecanismos empregados para refletir o preço do carbono são os certificados de redução de emissão de GEE, que normalmente adotam duas formas dentro de um instrumento de precificação de carbono. Em mercados de carbono, denominados cap-and-trade, os certificados são chamados permissões. Nestes sistemas há um limite de emissões de GEE dentro de um território, que pode ser uma região como a Europa ou um Estado como a Califórnia, e as permissões são os certificados utilizados para comprovar que a emissão das empresas está dentro dos limites legalmente estabelecidos. Por sua vez, certificados também podem ser originados por projetos de redução fora de regiões com um mercado de carbono estabelecido. Tais iniciativas, denominadas projetos de offset, criam um certificado de redução, conhecidos no Brasil como créditos de carbono, que podem ser comercializados. Os objetivos neste caso são de um lado criar um incentivo financeiro para que empresas possam, voluntariamente, investir em projetos e tecnologias que reduzam emissões de GEE e, de outro lado, permitir que empresas, governos ou pessoas compensem, também voluntariamente, suas emissões de GEE com a compra desses certificados. Por convenção, estes certificados representam uma tonelada de Dióxido de Carbono equivalente (CO2e), ou seja, um crédito de carbono equivale a uma tonelada de CO2e que deixou de ser emitida à atmosfera.
Anualmente, o Banco Mundial divulga um relatório sobre a adoção de instrumentos de precificação de carbono no mundo. O relatório “State and Trends of Carbon Pricing 2019” identificou 57 iniciativas de precificação de carbono implementadas ou em implementação no mundo e concluiu que, embora tais políticas continuem avançando, a cobertura e os níveis de preços permanecem insuficientes para atender aos objetivos do Acordo de Paris.
Esforços insuficientes para limitar o aquecimento em 2ºC
Segundo o relatório, apenas 20% das emissões globais são cobertas por uma política de precificação de carbono e menos de 5% desses estão em níveis consistentes de alcance das metas globais do Acordo de Paris. A análise ainda destaca a grande variabilidade de preços do carbono nestes instrumentos apontando que 51% das emissões reguladas são comercializadas por menos de dez dólares. Além disso, o relatório estima que, em 2018, os governos levantaram cerca de US$ 44 bilhões em receitas de crédito de carbono. Isso representa um aumento de mais de 13%, na comparação com os US$ 33 bilhões de 2017. Atualmente, o mercado Europeu (EU ETS) é o maior mercado de carbono no mundo, seguido pela Califórnia (California CaT). Este cenário mudará em 2020, quando o mercado nacional Chinês (China National ETS) será lançado.
Para Henrique Pereira, CEO da WayCarbon, os insights apresentados pelo relatório indicam que existe um consenso crescente sobre a utilização de instrumentos de precificação uma vez que estes são os meios mais custo efetivos para reduzir as emissões de GEE. O executivo destaca, contudo, que há um longo caminho pela frente: “A implementação de mecanismos de precificação de carbono é um desafio por se tratar de um tema ainda pouco conhecido, que possui elementos de desenho regulatório bastante específico e que demanda amplo diálogo para convencimento e construção de suporte político”.
Na medida em que as emissões de carbono seguem insuficientemente controladas, a janela de oportunidade para lidarmos com a questão começa a se fechar. Em 2018, ultrapassamos pela primeira vez 1°C de aquecimento médio da superfície terrestre em comparação ao período pré-industrial. Dados da Climate Action Tracker indicam que os compromissos atualmente assumidos pelos países nos colocam em uma trilha de aquecimento de 2,9°C, muito superior aos objetivos de Paris. Seguindo no mesmo nível de emissões, um aquecimento de 2°C deverá ser atingido na próxima década.
Mercado voluntário de carbono
Mas se o mercado de carbono regulado no âmbito do Acordo de Paris ou pelos governos nacionais e/ou subnacionais ainda precisa amadurecer, o mercado voluntário, isto é, aquele em que empresas, ONGs, instituições, governos ou mesmo cidadãos tomam a iniciativa de compensar suas emissões voluntariamente, vive a melhor fase há pelo menos uma década. O mercado atingiu um volume histórico de reduções de emissão emitidas em 2018, 62,7 milhões de tCO2e. O recorde anterior aconteceu em 2012, quanto 48,9 milhões de tCO2e foram emitidas em forma de créditos de carbono no mercado voluntário.
De acordo com o levantamento Voluntary Carbon Markets, da consultoria americana Forest Trends, essas atividades resultaram em mais de 430 milhões de toneladas de reduções de emissões desde 2005, o que equivale mais do que todas as emissões relacionadas à energia da Austrália em 2016. “Os atores no mercado voluntário estão experimentando uma onda de inovação, o que tem permitido encontrar novas formas para gerar crédito de carbono”, afirmou Pereira.
O relatório da Forest Trends mapeou 2008 projetos voluntários em 83 países e que podem ser comercializados livremente entre compradores e vendedores de diferentes nações. O Brasil tem o seu lugar de destaque nesse mercado, ocupando a 5º posição. Entre as iniciativas mapeadas, quase três quartos (72%) são localizados em cinco principais países: Índia (442), China (426), Estados Unidos (351), Turquia (124) e Brasil (97).
Resposta da iniciativa privada
O desafio de precificação do carbono não é exclusivo dos governos. As empresas se preparam para assumir a liderança nesse processo e colocaram a pauta da sustentabilidade no centro dos negócios. Em 2017, a Ticket Log liderou um projeto para geração de créditos de carbono por meio de substituição de gasolina por etanol na frota de veículos corporativo. Essa iniciativa contou com a parceria de várias empresas, a Braskem entre elas. Desde 2013, a empresa vem colocando em prática um programa voluntário de fornecedores com foco em sustentabilidade. A Braskem também participa de diversas iniciativas que contribuem para o fortalecimento da agenda na rede empresarial.
Empresas de diversas vertentes já entenderam que a preservação dos recursos naturais é uma vantagem competitiva. “Sustentabilidade é uma variável que afeta os negócios da mesma forma que a inflação, o custo dos insumos ou o cambio, que são variáveis que afetam a capacidade de produzir e de crescer das companhias”, afirma o CEO da WayCarbon.