Evaggelos Vallianatos || Historiador e estrategista ambiental. Trabalhou 25 anos na Agência de Proteção Ambiental dos EUA (EPA)
A palavra ecologia deriva da palavra grega oikos (lar, família). O zoólogo alemão Ernst Haeckel cunhou o termo no final do Século 19, a fim de descrever as relações entre os próprios animais e entre os animais com seu ambiente. O final do Século 19 foi tão revolucionário quanto o nosso tempo; também registrou a mesma agressão e falta de consideração em todos os assuntos do mundo natural. Foi uma época em que a pegada da humanidade começou a esmagar o mundo dos animais e das plantas. A industrialização era o novo paradigma para o “progresso”. Homens religiosos, empresários, políticos e acadêmicos queriam tomar parte da ação: controlar a natureza estava no coração dessa cultura emergente de máquinas. A química do petróleo alimentou os motores da produção e da destruição.
Haeckel e alguns cientistas europeus contemporâneos dele puderam ver que os humanos estavam destruindo as delicadas estruturas e as relações do mundo natural. Tal como os cientistas climáticos do Século 21, eles pensavam que a luz de como a natureza funciona iluminaria os governantes e diminuiria a ameaça humana ao meio ambiente.
Aristóteles
Eles modelaram sua ciência, incluindo a nova ecologia, no pensamento grego antigo. Aristóteles era especialmente perspicaz: ele foi o pai da biologia-ecologia. Charles Darwin foi tocado por Aristóteles. Ele continuou tentando explicar como a vida começou, mas enfrentou uma oposição persistente dos milhões de seguidores das religiões de um deus que pregava a criação do universo em sete dias e o domínio inquestionável do homem sobre os animais, as plantas e sobre a própria Terra.
Darwin leu uma das obras zoológicas de Aristóteles, “As Partes dos Animais” e ficou atordoado. Ele agradeceu a William Ogle, editor e tradutor das obras biológicas de Aristóteles. “Raramente li algo que me interessasse mais”, escreveu Darwin. “Das citações que tinha visto, eu tinha uma noção alta dos méritos de Aristóteles, mas não tinha a noção mais remota de que homem maravilhoso era ele. Carl Lineu e Georges Cuvier foram meus dois deuses, embora de maneiras muito diferentes, mas foram meros estudantes do velho Aristóteles” (Darwin to Ogle, 22 de fevereiro de 1882 em “The Life and Letters de Charles Darwin” de Francis Darwin).
Lineu, 1707-1778, foi um botânico sueco e Cuvier, 1769-1832, foi o pai francês da anatomia e da paleontologia comparativas modernas. Eles eram os “deuses” de Darwin. Eles eram, de fato, dois dos maiores cientistas da Europa que estudaram Aristóteles.
Georges Cuvier não tinha dúvida de que Aristóteles era um benfeitor da humanidade e um dos imortais. Cuvier e, também, não tinha dúvida de que Aristóteles, “o aluno de Platão, descobriu e demonstrou mais verdades e fez mais trabalhos científicos numa vida de 62 anos do que 20 séculos depois dele”.
Além disso, Cuvier na sua “Histoire des sciences naturelles” escreveu: “Devemos considerar Aristóteles como um dos maiores observadores que já existiram. Sem dúvida, seu gênio em classificar foi o mais extraordinário já produzido pela natureza. As grandes divisões e subdivisões do reino animal de Aristóteles são surpreendentemente precisas. Quase todas elas resistiram às adições da ciência”.
Teofrasto
Teofrasto foi um discípulo de Aristóteles que fez pelas plantas o que seu mestre tinha feito pelos animais. Ele se tornou um grande botânico e agrônomo, explicou qual era o lugar das culturas alimentares na natureza, incluindo o papel dos insetos na agricultura. Ele sugeriu o que os agricultores poderiam fazer para obter uma boa colheita. Explicou as doenças que o clima trouxe às árvores e descreveu as doenças das leguminosas e dos cereais. Como Hipócrates, ele pensava claramente que a influência do clima e do solo na agricultura era decisiva. Ele também relatou como os vegetais combatem insetos e as ervas daninhas. (Teofrasto, History of Plants). Essas ideias científicas extraordinárias, seguindo as contribuições biológicas e ecológicas originais de Aristóteles, foram alguns dos primeiros princípios ecológicos e observações sobre o manejo biológico de pragas na história. Teofrasto teve uma influência duradoura entre botânicos, estudantes do mundo natural e agricultores por vários séculos.
O escritor romano, Plínio, o Velho, relatou no final do primeiro século que os agricultores “tentaram todas as possibilidades” para melhorar suas árvores. O enxerto, disse Plínio, foi aperfeiçoado. (Plínio, História Natural)
Ecologia em resumo
Cientistas europeus e americanos exploraram essas ideias ecológicas para entender e defender o mundo natural. Eles criaram disciplinas acadêmicas ecológicas e do seu ensino. Disseram que se concentraram em ecologia, bioecologia, agroecologia, biologia ambiental, ciências ambientais e estudos ambientais: todos lidando com as relações do nível molecular ao das espécies, das relações e conexões dos animais e plantas no vasto mundo natural e o impacto dos seres humanos na evolução, sobrevivência ou extinção dos animais e plantas.
Natureza divina: deuses ecológicos
O que falta na ecologia moderna é a reverência que os povos antigos tinham pelo mundo natural. Os camponeses começaram seus dias com um pensamento respeitoso sobre a terra, as sementes e as divindades da natureza. Eles faziam ofertas num altar rural. Por outro lado, nosso agricultor orgânico moderno que trabalha na agroecologia ainda pensa de maneira materialista: solo, fertilizantes orgânicos, insetos, sementes, regulamentos governamentais.
Os gregos, chineses, egípcios e outros povos antigos imaginavam que os deuses faziam parte do cosmos e do mundo natural. Aristóteles e Teofrasto fizeram suas investigações biológicas no momento em que Deméter, deusa do trigo, era uma das divindades mais poderosas e amadas do panteão grego. Ela estava tão perto de ser a Terra quanto a própria Terra. Ela era a mãe de todas as coisas agrárias. Os Mistérios Eleusianos honraram Deméter. Foi a maior festa religiosa e agrícola da Grécia.
Dionísio, deus das uvas, do vinho e da vida rural, era uma grande figura na vida dos camponeses e governantes da cidade. Atenas teve duas celebrações anuais dedicadas a Dionísio.
Palas Atena, filha de Zeus, deusa da sabedoria, plantou uma oliveira em Atenas, a recém-fundada capital da região de Ática/ após uma luta contra Poseidon ela saiu vencedora e os deuses olímpicos batizaram a cidade com seu nome de ser divino. Os atenienses, além disso, homenagearam Atena com o magnífico Partenon, que eles dedicaram a “Atena Partenon” (Virgem Atena).
Pan era o deus dos rebanhos: animais domesticados. Ártemis era a deusa dos animais selvagens e do mundo natural. Aristeu, filho de Apolo, foi criado por Gaia (Terra) e Horai (deusas das estações). Ele era o deus da cura, profecia, abelhas, apicultura, pastoreio, olivicultura e produção de queijo. Esses deuses agrícolas ou ecológicos acrescentavam um dever invisível e raramente falado de proteção ambiental entre os gregos. O respeito e o amor que os membros de uma família sentiam um pelo outro metastatizavam as vastas e belas extensões de olivais, vinhedos, campos de trigo, rios, lagos, florestas – o Cosmo.
O paradigma da civilização ecológica
Não estou dizendo que os gregos antigos eram perfeitos ou vegetarianos. Apesar de Pitágoras ensinar que era contra comer animais, os gregos comiam carne. Mas, em termos muito amplos, os gregos, como os chineses, trabalharam com tradições éticas e políticas infundidas em sabedoria ecológica. A ideia de levar voluntariamente uma espécie à extinção era estranha a eles. Precisamos reviver essa ecologia antiga e torná-la uma cola de nossa cultura, transformá-la em civilização ecológica. Os chineses têm tentado fazer isso.
E depois que os estadunidenses se livrarem de Trump, o país deve se juntar à China no estabelecimento de uma civilização ecológica global. Quanto mais cedo isso acontecer, melhor. Em 2019, “civilização ecológica” significa basicamente não mais combustíveis fósseis ou agrotóxicos e um rápido retorno à agricultura familiar orgânica. Parar de comer carne ajudaria enormemente a reduzir as enormes e mortais quantidades de carbono e outros gases de Efeito Estufa que sobem diariamente para as nuvens. Essas transformações gigantescas podem domar o monstro das mudanças climáticas – nos dando mais tempo para fazer um mundo ecológico. Poderemos, então, desfrutar da vida civilizada.
Como parte dessa transformação global, não vejo razão para a Grécia não se lembrar de sua antiga civilização. Milhões de turistas visitam o país todos os anos apenas para ver as ruínas dessa civilização. Imagine o resultado de uma cultura helênica com os templos dos deuses em seus lugares originais, as Olimpíadas, a Academia Platônica e, acima de tudo, a Grécia vivendo os princípios da Hellas (Grécia, em grego: Hélade, oficialmente República Helênica). O país poderia se tornar o centro da civilização ecológica na Europa: abandonando os combustíveis fósseis. O deus Sol (Hélios) poderia fornecer a energia do país. A Grécia, mais uma vez, se tornaria o modelo para uma vida revalorizada, boa e agraciada pelo respeito ao mundo natural que, na realidade, é a que nos mantém vivos e prosperando.