A recente divulgação do Green New Deal (GND) proposto é um modelo, um esboço que identifica algumas das questões mais cruciais que a nação enfrenta em relação à mudança climática e uma lista de sugestões de medidas para abordar essas questões. Ele contém uma variedade de itens de agenda inspirados, muitos dos quais foram expressos pelo Partido Verde e grupos marginais ambientais em Washington por mais de uma década. De acordo com o press release do Green New Deal, 92% dos democratas e 64% dos republicanos apoiam a proposta. Quase todo democrata que está na corrida presidencial de 2020 o apoia. E o GND ganhou ampla aprovação nas comunidades de climatologia e ciências atmosféricas; entre centenas de organizações de conservação, meio ambiente, energias renováveis, ativistas sociais e dentro da geração mais jovem. Já faz muito tempo que a questão está em discussão e alguns pensam que é tarde demais. Mas, é uma visão otimista pensar que podemos reverter a aceleração das tendências do aquecimento global e mitigar seu impacto, mantendo o Planeta abaixo do marco de 1,5°C proposto pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) nos próximos 12 anos, e é ainda mais otimista pensar que o Congresso poderá promulgar uma legislação como essa sem priorizar os interesses das corporações multinacionais e lobbies que contribuem para suas campanhas de reeleição sobre as pessoas que os elegeram.
Não demorou para que os coautores do GDN, a Deputada Ocasio-Cortez e o Senador democrata Ed Markey, fossem atacados com críticas depreciativas de líderes corporativos e opositores políticos, incluindo democratas de base. Os críticos incluem o Presidente do Sindicato Internacional dos Trabalhadores da América do Norte, Terry O’Sullivan, que classificou o projeto como um “manifesto da fantasia” que criará “divisões e desigualdades”.
O Green New Deal, em grande parte, se baseia no precedente do idealismo existente por trás de grandes realizações na história dos EUA, quando a nação conseguiu se mobilizar para enfrentar desafios difíceis que os críticos argumentaram que nunca poderiam ser realizados. Exemplos incluem a transformação pelo Presidente Franklin Delano Roosevelt das indústrias automobilísticas e manufatureiras privadas para atender às necessidades militares durante a II Guerra Mundial; o sistema de rodovias interestaduais do Presidente Eisenhower e a realização da promessa do Presidente Kennedy de atingir a Lua antes do final da década de 1960. Embora Washington permaneça acuada pelos interesses dos lobbies de finanças e energia, em nível local, uma mudança construtiva está acontecendo. Mais de cem cidades em todo o país emitiram declarações prometendo a transição para 100% de energia renovável. Infelizmente, suas metas em termos de tempo estão longe do esperado. O melhor caso é o do Havaí que se propõe a atingir 100% de eficiência energética limpa em 26 anos. Os agricultores estão abandonando a agricultura química com uso intensivo de energia e fazendo a transição para o orgânico. Mas, o público está se tornando cada vez mais consciente e informado sobre seu uso de energia e mudando lentamente seus hábitos de consumo. No entanto, em comparação com outros países desenvolvidos, os EUA estão muito atrasados em alcançar metas realistas para abordar a previsão de 1,5°C do IPCC, que é excessivamente conservadora. Ausentes às limitações estatísticas do IPCC, o prazo real, de acordo com a maioria dos cientistas independentes do clima, é mais terrível. Podemos ter apenas 7 anos para abandonar os combustíveis fósseis.
No entanto, atingir a meta do GND é potencialmente factível se as indústrias do país e as financeiras se envolverem. A Suécia já recebe mais da metade de sua energia proveniente de fontes renováveis. Em 2015, o setor de parques eólicos da Dinamarca atingiu 140% das demandas de energia. Em 2016, Portugal atingiu um marco ao operar durante quatro dias sem quaisquer combustíveis fósseis. Devido aos seus recursos geotérmicos de energia limpa, a Islândia gera a energia mais limpa per capita do mundo; quase 90% de suas necessidades totais de energia são satisfeitas por fontes de combustíveis não fósseis. A Costa Rica recentemente conseguiu operar por mais de dois meses com 100% de renováveis. As parcerias público-privadas do Uruguai fornecem 95% de suas necessidades energéticas com recursos renováveis. Muitas outras nações também estão fazendo esforços agressivos para se alimentarem exclusivamente com energia limpa. E onde estão os EUA? De acordo com a US Energy Information Administration, em 2017 as fontes de combustível não-fóssil foram responsáveis por apenas 20% do consumo de energia. E ainda 34% do combustível para nosso setor de energia elétrica dependem do carvão. Embora a eliminação da dependência de combustíveis fósseis seja absolutamente crítica, a produção de eletricidade dos EUA representa apenas 28% de suas emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE). Embora a mudança para a energia renovável no fornecimento de energia elétrica seja muito provavelmente alcançável, os obstáculos para atingir a meta do IPCC são enormes.
Em nossa opinião, vários obstáculos podem impossibilitar que os EUA eliminem os combustíveis fósseis durante os próximos doze anos. Além da oposição interna no Partido Democrata por corporativistas como Nancy Pelosi, Chuck Schumer e Steny Hoyer, o custo para revisar toda a indústria, manufatura e desenvolvimentos tecnológicos atuais e novos seria astronômico. Um grupo de pesquisa Republicano, o American Action Forum, publicou recentemente um relatório estimando que o Green New Deal custaria entre US$ 51 trilhões e US$ 93 trilhões em dez anos, embora a maior parte desse montante esteja relacionada à oferta de empregos e assistência médica do Acordo, e não de suas propostas ambientais. Eliminando as emissões de carbono do setor de energia e transporte, o grupo disse que “apenas” custaria entre US$ 8,3 e US$ 12,3 trilhões numa década. A dívida nacional já é de quase US$ 22 trilhões e está crescendo. Desde que Trump assumiu o cargo, a dívida aumentou US$ 2 trilhões, e não há indicação de que vai diminuir. O clima cada vez mais extremo e seus efeitos posteriores só aumentarão ainda mais a dívida.
Um exame mais detalhado desses números é necessário. A etiqueta de preço “oficial” da “Guerra ao Terror”, que devastou o Oriente Médio nos últimos 20 anos, criando uma fonte infinita de inimigos futuros através do abate de aldeias inteiras cheias de civis através da guerra despersonalizada, recentemente subiu mais de US$ 6 trilhões, e uma investigação no ano passado revelou surpreendentes US$ 21 trilhões em orçamentos fraudulentos do Pentágono e do Departamento de Habitação e Desenvolvimento Urbano. Milhares de denúncias são varridas para debaixo do tapete pelo Inspetor Geral do Departamento de Defesa todos os anos em seus esforços para chamar a atenção para o desperdício e a fraude dentro das forças armadas mais ricas do mundo. A primeira tentativa de auditar o Pentágono, realizada no ano passado, foi um fracasso constrangedor, revelando que US$ 6,5 trilhões simplesmente haviam desaparecido. Os EUA gastam quase US$ 1 trilhão por ano em “defesa” – e enquanto ninguém iria sugerir o desmantelamento do exército americano, existem milhares de bases polvilhadas dos EUA em todo o mundo em países com conflitos não declarados. Certamente, parte dessa generosidade poderia ser reaproveitada para salvar o Planeta.
Há sempre dinheiro no orçamento para a guerra, que consome atualmente mais da metade de cada dólar gasto pelo governo dos EUA, apesar do fato de os EUA não estarem enfrentando ameaças militares credíveis por parte de atores estatais. Apesar das acusações sem provas que interferiram nas eleições de 2016, a Rússia não representa uma ameaça aos EUA. De fato, o Presidente Vladimir Putin expressou frustração em dizer que a Rússia estava “batendo numa porta fechada” em relação à amizade entre os dois países, tornada quase impossível com cada rodada de sanções draconianas impostas como uma forma de sinalização de virtude legislativa por congressistas ansiosos para demonstrar sua lealdade na Guerra Fria Parte 2. Mesmo a China prefere usar seus músculos economicamente, em vez de militarmente, gastando trilhões para construir seu projeto chamado “Cinturão e Rota” em todo o mundo em desenvolvimento e juntando aliados financiando grandes projetos de infraestrutura – onde os EUA historicamente impuseram às nações mais pobres a submissão através da força militar. O Green New Deal apenas tomaria aproximadamente as despesas anuais da Guerra ao Terror e as usaria para fins construtivos, ao invés de destrutivos. As tropas que retornam de guerras estrangeiras dispendiosas e destrutivas poderiam até mesmo ser colocadas para trabalhar no plantio de árvores ou na construção de infraestrutura, da mesma forma que projetos ambientais são realizados em nações menos ricas.
Esse número assustador de US$ 12,3 trilhões seria o custo se o Green New Deal fosse realizado da maneira tipicamente americana de lançar uma grande legislação. Se as reformas ambientais fossem promulgadas da mesma forma que em outros países, o número diminuiria drasticamente. Infelizmente, Ocasio-Cortez está aberta sobre seu desejo de trabalhar com “interesses comerciais” para fazer o trabalho, assim como Barack Obama estava disposto a trabalhar com as companhias de seguros para aprovar o Affordable Care Act, resultando em um plano ruim caro e falho que forçou os estadunidenses a comprar um seguro de saúde que não podiam pagar enquanto subsidiavam uma pequena fatia da população. Os custos com a saúde não baixaram – dispararam – e a qualidade da assistência médica certamente não melhorou. Envolver as corporações com seu sistema de valor de lucro acima de tudo garante que o Green New Deal enriquecerá conglomerados ricos como Bechtel e Halliburton. Estes receberão os grandes contratos para a construção de infraestruturas renováveis, o reaproveitamento da infraestrutura existente, etc., mas recontratarão outras empresas menores, segurando a maior parte do dinheiro como lucro. As empresas menores terceirizarão os empregos (construindo painéis solares no deserto, digamos, ou plantando uma floresta em fazendas agora abandonadas) com empresas locais mal remuneradas. Essas empresas locais, então, farão os trabalhos com os materiais mais baratos e padrões menos exigentes, na esperança de reter algum fundo que sobre para seus CEOs e investidores. Esse é o jeito estadunidense.
Se promulgada ao longo da rasteira de grandes projetos como o Affordable Care Act, o Green New Deal será essencialmente uma oferta às grandes corporações, ao qual Ocasio-Cortez afirma se opôr. Não é segredo que a verdadeira catástrofe climática que todos enfrentamos foi armada pelos interesses multinacionais interessados em impulsionar medidas de governança global como a única “solução” para o problema da mudança climática. Demasiadas vezes, isso fez com que aqueles que desconfiam dos motivos do Governo e da classe dominante também duvidassem da existência da mudança climática. Mas agir em grande escala não precisa ser extremamente caro ou envolver uma repressão autoritária aos direitos do indivíduo. China destacou o ano passado 60.000 soldados com o objetivo de aumentar sua cobertura florestal numa área do tamanho da Irlanda, de 21% para 26% até 2035. Até mesmo Bangladesh – um dos países mais pobres do mundo – copiando um programa semelhante ao da Tailândia, começou a plantar um milhão de árvores em 2017 após o desmatamento rural ter destruído as áreas rurais com a consequência de que milhares de agricultores estavam morrendo. A Índia estabeleceu um recorde mundial – duas vezes – ao usar milhões de voluntários para plantar árvores a fim de alinhar suas florestas aos compromissos assumidos no Acordo de Paris. Com tecnologia moderna como “bombardeio de sementes”, um único avião ou drone pode plantar 900.000 árvores em um dia, deixando cair sementes envoltas em feixes de solo prontos para o crescimento. Essa tecnologia já é usada na África e avançou significativamente além da simples queda de sementes indiscriminadamente – os modernos drones de bombardeio de sementes estão equipados com capacidade de geração de imagens para garantir que as sementes cheguem onde têm maior probabilidade de prosperar. Nada disso exige terceirização, subcontratação, nem corte das margens de lucro, ou qualquer uma das abordagens tipicamente estadunidenses para o problema, e economizará bilhões.
Confiar no Governo para fazer a coisa certa quase invariavelmente deixa alguém desapontado. Se não fosse Ocasio-Cortez forçando a cooperação com a comunidade empresarial como parte integrante do Acordo, seria outro congressista. Quando tudo o que você tem é um martelo, tudo parece um prego, e a Câmara de Comércio dos EUA – o “lobby empresarial” – é tão grande que é difícil para os legisladores enxergarem fora de suas fronteiras. Acrescente-se o tamanho do “lobby energético” e é fácil ver como os legisladores acham difícil conceber a tomada de ação em grande escala de uma forma que não beneficie principalmente grandes corporações. A voz do povo não foi ouvida em Washington em décadas e é duvidoso que seja reconhecida se for ouvida.
Além disso, embora os EUA sejam o segundo maior emissor mundial de gases de Efeito Estufa (15% das emissões globais totais), a China ultrapassa em 30%. Juntamente com a União Europeia (10%) e a Índia (6%), estas quatro regiões representam mais de metade de todos os GEE. É bom destacar que 100 países em desenvolvimento combinados contribuem apenas para 3,5%. O lançamento de um Plano Marshall global e universal pode estar além dos meios da humanidade. Se considerarmos que a China está atualmente construindo uma grande megalópole que cobrirá mais de 13 mil quilômetros quadrados – maior do que a Grã-Bretanha ou a Nova Inglaterra – é impossível imaginar como uma operação urbana tão gigantesca não poderia ser insustentável e dependente de combustíveis fósseis. A próspera cidade de Jing-Jin-Ji será a maior concentração de seres humanos do Planeta, habitação de mais de 130 milhões de pessoas, ou o equivalente das populações combinadas das quatro maiores cidades do mundo: Tóquio, Nova Delhi, Xangai e São Paulo. E todos esses moradores vão querer as conveniências de um estilo de vida moderno e ocidental: mais carros, mais carne em suas mesas e mais luxos que consomem energia.
Surpreendentemente, pesquisas parecem indicar que os chineses são mais instruídos sobre a mudança climática do que o estadunidense médio. Após as ondas de calor recorde do ano passado, secas, um tufão da categoria 5 e inundações repentinas, 94% dos entrevistados disseram acreditar que a mudança climática está acontecendo agora e 66% acreditam ser antropogênica. Setenta e três por cento estão dispostos a pagar mais por produtos amigos do clima. No entanto, semelhante aos americanos médios, os chineses não estão mudando seus hábitos de consumo para se adaptar à nova realidade climática. Da mesma forma, semelhante aos EUA, o governo chinês está ansioso para avançar com projetos de crescimento insustentáveis que aumentem em vez de diminuir as emissões.
Entre os outros obstáculos que o Green New Deal enfrentará está o fato de Washington, quase ter alcançado seu objetivo de ser totalmente independente de energia. Enquanto produzimos mais energia no mundo, também consumimos mais per capita. Os EUA também subiram para o terceiro maior exportador de combustíveis fósseis, depois da Arábia Saudita e da Rússia. Juntas, essas três nações respondem por 38% do total mundial de petróleo. Ao mesmo tempo, os EUA ainda precisam importar petróleo, predominantemente para nossas demandas de automóveis e transporte. Embora os EUA agora produzam cerca de 11 milhões de barris por dia, consomem quase 20 milhões de barris por dia. Para a produção de gás natural, os EUA são o rei, e espera-se que atinja mais de 90 bilhões de pés cúbicos por dia de produção, de acordo com a EIA (Agência Internacional de Energia). As abomináveis políticas de Trump revitalizaram a indústria do carvão e aumentaram a produção. Pior ainda, as indústrias de petróleo e carvão são as receptoras do monstruoso bem-estar corporativo, com o montante de US$ 20 bilhões em subsídios anuais do governo.
Jeremy Brecher observa corretamente que “o aquecimento global foi justamente chamado de o maior fracasso de mercado da história. Corrigir isso não pode ser deixado para o mercado”. Ao contrário da urgência artificial de construir um muro tolo na fronteira, a mudança climática é a emergência nacional. É uma emergência planetária. Portanto, quando milhares de grandes e pequenas empresas ligadas ao carvão e gás-petróleo obtêm enormes ganhos inesperados, empregam quase 1,1 milhão de trabalhadores – em comparação com menos de 374.000 trabalhando em tempo integral ou parcial em energia solar e 102.000 em empresas eólicas – não há incentivo para que esses grandes emissores de gases de Efeito Estufa desçam do trem da história e passem para formas de energia mais limpas e renováveis.
Um segundo grande obstáculo ao Green New Deal é que todas as nossas principais instituições, políticos, legisladores e líderes de opinião, think tanks e fundações, e a grande mídia que é controlada por essas instituições, não vão desafiar de verdade o paradigma do capitalismo de livre mercado e o mito de que o crescimento econômico constante e a expansão irão melhorar a sociedade. Isso significa que apenas teremos mais poluição tóxica, expansão urbana, destruição do meio ambiente, de hábitats, o esgotamento dos recursos naturais, e com isso, estações mais quentes e eventos climáticos mais extremos, como tempestades, secas, incêndios florestais e enchentes.
Estamos presos no ciclo perpétuo de ganhar mais para comprar mais e acumular mais dívidas. A transição do consumo de combustíveis fósseis para aumentar o investimento em energias renováveis e as novas tecnologias necessárias para atingir a meta do IPCC significa a mudança rumo a uma economia muito mais lenta ou sem crescimento, a fim de alcançar um futuro mais sustentável. Pode exigir até US$ 10 trilhões para reprojetar indústrias e infraestruturas inteiras, a fim de alcançar algo próximo de zero emissões. No entanto, com a nova classe rica de 11 milhões de milionários estadunidenses que governam as indústrias privadas, os investimentos e a formulação de políticas para manter a agitação do motor capitalista, a promulgação do tipo de agenda verde proposta e exigida hoje é improvável. Novamente, não há incentivo para que a elite dominante reduza o consumo. As legiões de lobistas em Washington farão todos os esforços para acabar com o Green New Deal e garantir que ele morra na praia. A classe dominante não tem lealdade à nacionalidade. É a classe mais antipatriótica da nação. Quando as tensões da mudança climática ficam difíceis ou sua segurança pessoal e bens são ameaçados, a classe dominante tem os meios para se mudar para outro lugar.
Além disso, a classe dominante e a população conservadora – mesmo aqueles educados o suficiente para concordar com mudanças climáticas antropogênicas – se apoiam fortemente nos valores libertários, o que significa menor governo e mais liberdade para o livre mercado. Olhando para o Green New Deal de qualquer ângulo, é claro que este plano exigirá a entrega de enorme poder a Washington. A confiança em todos os ramos do Governo já se desgastou num nível em que mesmo os verdadeiros progressistas duvidam de algo bom que possa sair do duopólio em Washington. Portanto, uma porcentagem considerável do público desconfiará profundamente da vontade e competência do Governo na execução de qualquer legislação que surja do esquema do Green New Deal.
A economia de livre mercado está poluindo tudo, criando mares de plástico, aterros de lixo tóxico e lojas de computadores e equipamentos eletrônicos. Florestas e ecossistemas estão sendo nivelados para expandir o crescimento. Há pouco ou nenhum tempo para mudar radicalmente nossas indústrias de aço, automóveis e alta tecnologia. E as indústrias privadas e os comportamentos coletivos de consumo da população não mudarão da noite para o dia. Enquanto elogiamos os autores do Green New Deal e a bancada progressista que o apoia, encorajamos o público a não se tornar passivo, com altas expectativas de que Washington esteja disposta, ou seja, capaz de resolver a crise climática. Não há salvadores. A fé cega não deve ser direcionada ao cumprimento de Washington nem às novas tecnologias desenvolvidas para nos ajudar. Vivemos em tempos extremamente tensos; mas tempos drásticos exigem medidas drásticas. Na verdade, o negócio pode não ser radical o suficiente. Acabar com nossos gastos militares – o maior consumidor de combustível fóssil, bem como o maior recebedor de nossos impostos – e o aventureirismo do Washington Consensus para instigar mudanças de regime à medida que o mundo queima, é algo que está fora da agenda.
Existe alguma solução factível sem que o corpo político do Governo atrapalhe? Reduzir os GEEs não pode mais ser considerado apenas um desafio para o setor público e privado. É uma responsabilidade de todo indivíduo.
Primeiro, o público deve se conscientizar profunda e conscientemente do problema climático e de como nossas vidas e cultura contribuem para o aquecimento global. Também precisamos nos tornar conscientes de como nossas vidas mudarão à medida que o mundo se deteriorar. Nosso sistema educacional tem sido um completo fracasso em ensinar às pessoas sobre a ciência básica da mudança climática e os impactos imediatos e de longo prazo do aquecimento global. Nada do que podemos fazer mudará eficazmente o derretimento do gelo do Ártico, o aquecimento dos oceanos e das zonas mortas, a liberação de metano em multi-gigatoneladas com o derretimento do permafrost, a dizimação de populações de insetos que contribuirão para crises alimentares globais, elevação das águas costeiras e a nova temporada de incêndios recorde nos Estados ocidentais. A próxima Categoria 5 de um super furacão pode ser a gota d’água para muitos moradores da Flórida e residentes ao longo do Golfo. O consumo excessivo industrial está esgotando nossos aquíferos.
Segundo, cada pessoa e família podem começar a transição gradual para uma dieta baseada em vegetais. Isso não precisa ser uma mudança abrupta. Podemos começar nos alimentando sem carne um dia por semana e depois aumentar os dias. A indústria agrícola gera entre 10% e 40% de GEEs, principalmente metano e óxido nitroso, dependendo de quais métricas estão sendo usadas nas equações. A Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação estima que a produção pecuária é responsável por cerca de 14,5% de todas as emissões causadas pelo homem. Nos EUA, 42% das emissões agrícolas são provenientes da criação de gado, e globalmente representa aproximadamente 16% de todos os GEEs gerados por humanos, Quando o armazenamento, transporte e distribuição de carne e produtos são adicionados, a pegada de CO2 aumenta substancialmente. Imagine a pegada de um único caixão de tomates indo de uma fazenda na Califórnia para um supermercado em New York. Se um número suficiente de pessoas também comprar mais alimentos cultivados localmente, isso também teria um impacto. Esses são dois esforços – uma dieta sem carne e a compra local – que todo estadunidense pode adotar para ser parte da solução, e não o problema.
Terceiro, nossos comportamentos de consumo estão viajando num trem de alta velocidade para um precipício. Temos a opção de fazer escolhas conscientes sobre nossos hábitos de compra. Há apenas uma solução para isso, que é reduzir o tamanho, comprar apenas o que é essencial para as nossas necessidades e encontrar outras maneiras de aumentar a qualidade de nossas vidas. Antes de fazer uma compra, considere a pegada de carbono do item antes de chegar às suas mãos. À medida que o mundo se aquece e aumentam os estresses econômicos e sociais da vida, inevitavelmente chegará um tempo em que as pessoas serão forçadas a reduzir o tamanho. Não será mais uma questão de escolha.
Finalmente, se estiver dentro de seus meios financeiros, encontre formas de aumentar sua independência com fontes de energia limpa e renovável. Se você puder instalar painéis solares para sair da rede e tornar-se autossuficiente em energia, ela será compensada em longo prazo. Embora ainda exista um debate considerável sobre se nossa civilização global atingiu ou não um momento de “pico petrolífero”, os preços do petróleo aumentarão inquestionavelmente no futuro.
O que a nação pode fazer coletivamente é vagamente resumido no Green New Deal. Durante uma coletiva de imprensa após a divulgação do projeto, o Senador Markey e a Deputada Ocasio-Cortez deixaram claro que o plano, neste momento, não inclui nenhuma “prescrição individual” para as questões descritas. Os detalhes e a legislação a seguir serão desenvolvidos após a votação e aprovação no Congresso e a criação de um Comitê no Congresso para desenvolver as soluções. No entanto, o Acordo é claramente definido como um “plano de mobilização econômica, nacional e industrial”. Levará anos para que os EUA se tornem “neutros em emissões de Gases de Efeito Estufa”. O projeto observa que será necessário um “investimento maciço” para reduzir futuros GEEs, ser eficiente em termos energéticos, “modernizar toda a nossa infraestrutura, base residencial e industrial para uma eficiência energética de última geração” e eliminar os GEEs da indústria agrícola. O projeto também inclui a necessidade de ampliar a educação e o treinamento para esse esforço de mobilização nacional.
O Green New Deal também reconhece que a rede de energia dos Estados Unidos é um desastre. A maioria das pessoas e até mesmo a maioria dos políticos não sabem que nossas infraestruturas de energia são extremamente ineficientes. Numa análise realizada pelo Lawrence Livermore National Laboratories para avaliar o consumo de energia dos EUA, 59,1% da geração de eletricidade foi “energia rejeitada” – energia perdida devido a ineficiências em usinas, motores, prédios, etc. Quase toda essa “energia rejeitada” é gerada a partir de carvão, gás natural e petróleo. No relatório Livermore, as fontes de energia renováveis, como solar, eólica e geotérmica, pouco contribuíram para qualquer perda de energia infraestrutural. E, ainda assim, Washington e o Governo Trump, em particular, acham viável economicamente subsidiar essas indústrias de combustível fóssil por sua inépcia, negligência em relação à eficiência energética e desperdício exorbitante. Até mesmo Ocasio-Cortez parece acreditar que o progresso pode ser alcançado trabalhando com esses monumentos para a ineficiência. Isso é ingênuo na melhor das hipóteses e, na verdade, é falso. Num verdadeiro sistema capitalista – como o nosso Presidente presta declarações em qualquer oportunidade – os melhores desempenhos se destacam. Por que, então, o Governo ajuda continuamente sistemas falidos que vão de energia a bancos? Esse dinheiro seria mais bem investido no financiamento de alternativas sustentáveis.
Um simples fato de que os opositores do negócio na indústria privada, Wall Street e negadores da mudança climática não conseguem entender como regra é que os enormes custos para a implementação de um New Deal já estão aqui. E eles vêm aumentando anualmente devido à crescente frequência e danos causados por eventos climáticos extremos devido à confusão da humanidade com a atmosfera e o meio ambiente. A NASA informou, de forma conservadora, que US$ 91 bilhões foram perdidos em danos devido a episódios de mudança climática somente em 2018. E a mais recente Avaliação Nacional do Clima do Governo Federal adverte que chegaremos rapidamente a US$ 500 bilhões por ano em perdas econômicas devido à elevação do nível do mar e à piora do clima, secas, tempestades, enchentes e incêndios.
Em seguida, é pura negligência que os governos federal e estaduais não tenham conseguido atualizar nosso sistema de transporte público. Os EUA ficam muito atrás, em seu ineficiente sistema ferroviário, em comparação com os trilhos de mais de 200 km/h na China, França, Japão e outros lugares. Criar um novo sistema ferroviário de alta velocidade em toda a América pode ser otimista demais neste momento; no entanto, a atualização de nossos trens entre os principais centros urbanos é perfeitamente possível imediatamente. Isso significaria trilhos de alta velocidade entre Boston, Nova York, Washington, Chicago, Dallas, Houston, Los Angeles, São Francisco e Las Vegas, para começar. Os trens de alta velocidade entre esses centros urbanos reduziriam significativamente a pegada de carbono do transporte e poderiam até ser mais rápidos do que as companhias aéreas, considerando o tempo gasto nos aeroportos. Também poderia ser realizado em nível estadual por meio de parcerias público-privadas. Além disso, um incentivo fiscal poderia ser adicionado para aqueles que usam o transporte público.
Finalmente, a nação precisa agir imediatamente sobre um programa nacional de reflorestamento e reverter as leis regressivas de Trump para devastar ainda mais terras públicas e ecossistemas para aumentar os lucros corporativos. Florestas e árvores são reconhecidas como talvez o recurso natural mais importante para compensar as emissões de carbono. China e Índia estão fazendo grandes avanços no reflorestamento de suas nações. A China reservou uma área quatro vezes maior que a do Reino Unido para reflorestamento. Existem poucas áreas no Planeta com grandes áreas de copas florestais. A maioria está localizada no Norte do Canadá, nos países da América Latina na Bacia Amazônica, na Escandinávia e na Rússia. Portanto, recomendamos um corpo nacional de conservação para iniciar uma campanha agressiva de reflorestamento. A Índia mantem o recorde mundial do plantio de 66 milhões de árvores, em 2017, num período de 12 horas.
Apesar de todos os pontos positivos do Green New Deal, ele não será levado em parte alguma se a legislação que der resultado estiver repleta de brindes para as mesmas indústrias e corporações que nos levaram à ruína ambiental e econômica em primeiro lugar. O desejo de Ocasio-Cortez de colaborar com esses atores pode nascer de um genuíno desejo de cooperação, mas é mais provável que seu socialismo democrático esteja sendo usado como um rosto mais palatável para o mesmo neoliberalismo voraz que criou todos os problemas que o GND pretende resolver. Enquanto esperamos que o Governo trabalhe em conjunto e legisle para sair dessa confusão, seria sensato começar a resolver tantos problemas quanto pudermos, ao mesmo tempo em que colocamos os pés de nossos representantes do Governo no fogo.