Para lembrar e relembrar o Dia do Meio Ambiente que se aproxima, sendo comemorado amanhã (04), publicamos a reflexão de Samyra Crespo sobre a pauta
* Por Samyra Crespo
Na Semana do Meio Ambiente, não se espera outra coisa se não uma avalanche de informações, denúncias, anúncios de feitos e mal-feitos, uma profusão de bordões politicamente corretos e de palavras de ordem.
Afinal, em qualquer ponto em que você se encontre no espectro do ativismo, ou simpatizante da causa, este é o momento que a mídia volta seu interesse para o que dizemos e pensamos.
O resultado é uma overdose de idéias, um overload de experiências em forma de textos e imagens mobilizadores.
Tem muita coisa a ser observada, incluindo o papel que a Rede Globo, hegemônica em nosso país, vem desempenhando, dando cada vez mais espaço à agenda ambiental na sua programação diária, em todas as suas nuances: desde um Globo Repórter na linha viagens e experiências a la ‘National Geographic’ até o ‘Cidade e Soluções ‘ onde o hardware do enfrentamento dos problemas é comandado pelo jornalista ambientalista André Trigueiro.
Gabeira e Miriam Leitão completam um time de respeito.
A Marcia Hirota, presidente da S.O.S Mata Atlântica, nos avisa que o Grupo está realmente comprometido com o programa de sustentabilidade, cunhado hoje com o nome de ESG: ‘Environment, Sustainability and Governance ‘.
Há pouco tempo chamávamos esse tipo de engajamento de ‘Responsabilidade Empresarial’ no triplo bottom line.
Mas os conceitos evoluíram e apareceu o termo ‘Governance’ na parada. O termo não é novo, mas a prática a ele associada está em plena fase de ascensão no ranking das prescrições sobre sustentabilidade ‘via mainstreaming’.
Vamos ser otimistas. Como disse a ministra Marina Silva, não temos outra escolha a não ser sermos otimistas. Pessimistas no diagnóstico, otimistas na ação.
Porém, há que esperar o que restará de tantos programas especiais, das falas dramáticas, plantios devidamente registrados nas telas do celular e como esse caldo de cultura novo e vibrante vai afetar- ou não – as decisões pragmáticas de forte impacto sobre nosso futuro.
Ainda teremos que acompanhar a movimentação do Congresso, das assembleias estaduais e ainda as que estão sob o poder de decisão dos vereadores nas câmaras municipais.
Se é verdade que em muitas questões estamos caminhando resolutos para um comportamento ambientalmente adequado, em outras há um claro vetor que aponta retrocessos.
E não é uma Semana do Meio Ambiente que vai deter a indústria do petróleo e da mineração, a ganância do ‘agro’ por mais terras para cultivo e gado, nem tampouco a onda privatista que agora quer devorar as faixas marítimas da orla do país.
A cultura tem esse poder: o de plasmar uma consciência. Mas a política tem o poder maior de fazer a transição do nível do discurso para o da realidade, da palavra ao gesto.
Esse casamento entre as duas esferas precisa ser cimentado, a começar pelas próximas eleições municipais.
Temos, como cidadãos, que traduzir os reclames globais por um planeta sustentável, em nossa decisão de voto. Do indivíduo para a vontade coletiva, da vontade coletiva para o indivíduo: esse é o caminho.
Não podemos eleger prefeitos e vereadores que claramente não se comprometerem com água e ar limpo, comida sem agrotóxico, restauração da vegetação do bioma onde vivemos, prevenção e adaptação às mudanças climáticas – com planos detalhados de como lidar com enchentes, deslizamentos, incêndios florestais, eventos extremos onde eles forem previsíveis.
Planos de contingência, investimentos na defesa civil profissional e voluntária.
Creio que a despeito de todas as possibilidades de engajamento para quem se importa com as questões ambientais, as próximas eleições de outubro serão decisivas.
Com elas poderemos verificar se o despertar ético global está conseguindo tradução adequada no plano local, onde vivemos e morremos com dignidade, ou não.
Dizem os psicólogos que o aprendizado humano vem pelo amor ou pela dor.
Na minha modesta opinião as duas coisas ensinam. Mas o impacto do que vimos no RS e em outros locais, parece ter derrubado o véu de qualquer inocência sobre nosso futuro.
E agora, está em nossas mãos e nas dos líderes que escolheremos.
* Graduada em História e especialista e doutora em História Social pela Universidade de São Paulo. Ex vice-presidente do Conselho do Greenpeace.