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Sexta Extinção: dessa vez não serão asteroides, mas nós mesmos, a própria humanidade

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Jorge Pontes | Delegado da Polícia Federal que idealizou e instalou a unidade de repressão aos crimes ambientais na instituição. É autor do livro Guerreiros da Natureza – A História do Combate aos Crimes Ambientais na Polícia Federal

Jorge Pontes – Arquivo Pessoal

Essa semana circulou pelas redes sociais um vídeo com uma cena verdadeiramente monstruosa: um filhote de onça amarrada a uma árvore, tendo ao seu lado duas cabeças de onças adultas decapitadas. A ministra do Meio Ambiente Marina Silva, tão logo tomou conhecimento da gravação, solicitou medidas investigativas à Polícia Federal, para assinalação da autoria desse ato brutal.

Sobre o mesmo tema, em matéria jornalística veiculada no último domingo, vimos uma ação da nossa Polícia Federal sobre um grupo de criminosos ambientais – caçadores – que abatiam a tiros de espingarda – risonhos – búfalos selvagens (espécie exótica) em uma fazenda no interior de Goiás.

Caça esportiva de búfalos, chacina de felídeos de grande porte, ameaçados de extinção, tudo isso em pleno século XXI, num momento em que a humanidade já foi devidamente informada, pela própria Ciência, dos riscos que enfrentamos com o decréscimo vertiginoso da biodiversidade no Planeta, é mais do que lamentável: é trágico.

ATENÇÃO: IMAGENS FORTES

Para completar o cenário de desolação, há poucos dias – mais precisamente no dia 18 de março – foi publicado pelo jornal britânico The Observer, e assinado por Robin McKie, da editoria de ciências, os resultados de um trabalho capitaneado por pesquisadores do Instituto Weizmann de Ciência de Israel, que concluiu que os mamíferos terrestres selvagens vivos hoje têm uma massa total de 22 milhões de toneladas. Em comparação a essa cifra, a humanidade pesa atualmente um total de cerca de 400 milhões de toneladas.

Enfim, o peso total dos mamíferos selvagens da Terra é inferior a 10% do que pesa a humanidade – homens, mulheres e crianças que vivem no planeta. De elefantes a leões e de cervos à bisões, o estudo revela a escala de danos à vida selvagem causados pela transformação de áreas selvagens e pelas atividades humanas no Planeta.

Ao mesmo tempo, as espécies que domesticamos, como gado, cabras e ovelhas, além de alguns parasitas, como roedores urbanos, adicionam mais 630 milhões de toneladas à massa total de criaturas que agora estão competindo com mamíferos selvagens pelos recursos da Terra.

Só para termos uma ideia, a biomassa de porcos domésticos – sozinha – é quase o dobro da de todos os mamíferos terrestres selvagens hoje existentes…

Os números da pesquisa demonstram claramente que a transformação dos desertos e habitats naturais do planeta em uma vasta plantação global, operada pelos homens, está “bem encaminhada” – com consequências devastadoras para a vida selvagem. O mundo natural e seus animais selvagens, como o conhecemos, estão desaparecendo à medida em que a população humana de quase oito bilhões de indivíduos continua a crescer.

Decerto que os estudos de biomassa não são a única maneira de quantificarmos o mundo animal. O número de espécies (biodiversidade) também é revelador. A assinalação da biomassa é um ponto complementar à riqueza de espécies e outras métricas de biodiversidade, e pode servir como um indicador da abundância e do “registro” ecológico dos mamíferos selvagens em escala global, afirmam os cientistas que lideraram a pesquisa, que foi denominada de “Global Biomass of Wild Mammals” – a biomassa global de mamíferos selvagens.

No tocante ao Brasil – que é a nação mais biodiversa do mundo – segundo o Professor Leandro Salles, do Museu Nacional do Rio de Janeiro, a perda da biodiversidade de mamíferos se deve, predominantemente, à devastação das coberturas naturais, sejam elas do Cerrado, da Caatinga ou da Mata Atlântica. Segundo ele, excetuando-se as áreas remanescentes da Amazônia e do Pantanal, “o Brasil é hoje uma grande fazenda”. O Professor Salles também aponta “o atropelamento em massa de nossa fauna como algo praticamente inevitável”, devido justamente à profunda fragmentação sofrida pelos nossos biomas, que cada vez mais são recortados por uma malha de estradas onde circulam – sem proteção, corredores e passagens especiais para a fauna – toda a frota de caminhões do maior produtor de agro do planeta.

O professor Salles afirma que, se nada for feito em relação ao avanço da destruição das coberturas florestais no Brasil, aqueles que viverem mais vinte anos verão a Amazônia sucumbir, tornando-se, a exemplo dos outros biomas brasileiros, apenas fragmentos, isto é, cacos do que um dia foi uma floresta majestosa, abrigo de uma biodiversidade incomparável.

Vivemos, então, uma contagem regressiva para a extinção em massa de milhares de espécies de animais selvagens, o que será uma tragédia ambiental sem precedentes, pois a perda da biodiversidade vai impor prejuízos incalculáveis para o homem no nosso planeta. Estamos, desgraçadamente, às portas do que poderemos considerar como a “Sexta Extinção”. E desta feita não houve necessidade, como nos cinco episódios anteriores, de mudanças climáticas fortuitas ou a chegada de asteroides: nós, a raça humana, somos a causa direta.

Serra do Amolar – Foto: Araquém Alcântara

A par dessa triste realidade, a humanidade e suas lideranças parecem não reagir à altura. O homem de hoje, talvez em razão do conhecimento de sua própria finitude, parece não demonstrar preocupação em relação aos eventos cujos efeitos transcendem a sua própria existência individual. A inércia – geral e planetária – para a tomada de medidas enérgicas em relação a todas as ameaças ambientais que enfrentarmos é uma prova disso.

Apesar da caça não ser a maior causa da perda da biodiversidade, é inconcebível que seres humanos – nos dias de hoje – abatam a tiros “esportivamente” animais selvagens – que são nossos companheiros de jornada terrestre. Nada mais covarde e deplorável – e emblemático em relação à nossa insensibilidade e estupidez – do que um homem matando uma onça por esporte.

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