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A fúria do clima

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Arthur Soffiati

            Entre 2 bilhões e 350 milhões a 2 bilhões e 220 milhões de anos passados, a Terra foi coberta de gelo pela glaciação de Makgnyene. De polo a polo, uma calota gelada cobriu o planeta. Se um fenômeno climático como esse se repetisse, seria difícil prever como a humanidade se comportaria. Sobreviveria ou se extinguiria? Mas não havia humanos nos 100 milhões de anos em que a Terra ficou sob o gelo. Nem vida pluricelular existia. A vida unicelular resistiu. Há 65 milhões de anos, um grande asteroide colidiu com a Terra, provocando a extinção de muitas espécies, sobretudo de dinossauros. A humanidade ainda não existia para sofrer os danos desse impacto colossal. Se outro asteroide de tamanho semelhante estivesse na iminência de se chocar com o pequeno planeta em que vivemos, as mentes brilhantes da ciência teriam como evitar estragos que poderiam levar a humanidade à extinção?

            Durante o último milhão de anos, a Terra sofreu quatro glaciações e quatro períodos interglaciais. Foi em meio ao frio intenso que a humanidade se constituiu. Pode-se até considerar que as quatro glaciações representaram um grande desafio para os humanos e seus ancestrais, cuja reposta foi a invenção da cultura material, das técnicas de produção do fogo, da sepultura e da arte. Nesse um milhão de anos, o cérebro dos hominídeos se complexificou, permitindo que, com o recuou da última glaciação, em torno de 12 mil anos passados, a humanidade inventasse a domesticação de plantas e animais, criando a agricultura e o pastoreio. Vivemos o quarto momento interglacial a que, no século XIX, batizamos de época do Holoceno.

Paleolítico no Brasil. Serra da Capivara

            Nos últimos 10 mil anos, algumas civilizações passaram dos limites da natureza e provocaram crises ambientais. Estudiosos tendem a explicar o fim da civilização do Camboja pelo uso excessivo de água e pelo desmatamento de encostas. No vale do rio Indo, o desmatamento para a obtenção de lenha e madeira também teria levado ao declínio da civilização que lá floresceu. Idem na América central, no mundo maia, e na ilha de Páscoa. Mas tais crises tinham âmbito local e eram reversíveis, embora, na ilha de Páscoa, a paisagem continue desolada.

Civilização Khmeriana, Camboja – vitória da floresta

            A crise provocada pela economia de mercado, nos últimos 500 anos, é bem distinta. Primeiramente, ela não é mais local, e sim global, porque o ocidente englobou o mundo todo num sistema econômico que ultrapassa os limites da natureza em produzir recursos e em sua capacidade de absorver resíduos. Com a Revolução Industrial, no fim do século XVIII, os minerais à base de carbono começaram a ser usados intensivamente como fonte de energia. Primeiro, foi o carvão natural. Depois, o petróleo e o gás natural. A queima desses minerais fósseis libera gases que espessam a camada natural de CO2. O lençol necessário para manter a Terra aquecida transforma-se em edredom. O planeta esquenta demais e provoca mudanças climáticas que pegam desprevenidos ecossistemas, animais e humanos adaptados às condições climáticas do Holoceno, por mais que elas sofram oscilações.

            Os fenômenos climáticos naturais, como El Niño e La Niña, intensificam-se. Tem-se ouvido e lido muito na imprensa que a combinação das mudanças climáticas com o fenômeno natural do El Niño acarretará desequilíbrios climáticos neste ano de 2023, prosseguindo caso ele permaneça. O clima em que vivemos é natural. Mas ele está sendo alterado pelas atividades da humanidade. Não se pode mais falar que El Niño é um fenômeno natural combinado com as mudanças climáticas. Ele já vem sendo potencializado pelas mudanças climáticas antrópicas há muito tempo.

Ação do El Nino no planeta

            O clima tornou-se agressivo para a natureza do Holoceno e para a humanidade. As temperaturas da Terra começaram a ser medidas em 1850. Claro que não com a precisão dos dias de hoje. Esse ano deve ser tomado como base para nossas discussões, e não datas tiradas não sei de onde ou não devidamente esclarecidas. Falou-se do dilúvio que se abateu sobre Nova Friburgo, em 2011, tratar-se de um fenômeno milenar, o mesmo valendo para as altas temperaturas e chuvas que assolaram o leste dos Estados Unidos no início do verão de 2023. Esses números mais confundem que esclarecem.

            Tomando o ano de 1850 e acompanhando o comportamento do clima, conclui-se que muito CO2 e metano foram liberados para a atmosfera do Holoceno desde 1500. Primeiro, com o desmatamento. Depois com a queima de combustíveis fósseis. A Terra aguentou o tranco até a década de 1970. A partir de então, as mudanças climáticas foram se tornando hostis à vida e à humanidade, toda ela envolvida na economia de mercado disseminada pelo ocidente. Primeiro, não percebemos que estávamos serrando os pés da cadeira em que estávamos sentados. Depois, negamos que a humanidade tivesse o poder de alterar o clima. Agora, começamos a admitir que o clima mudou e está enfurecido. Mas estamos perplexos. Nossa economia e nossas cidades estão mostrando sua vulnerabilidade. O clima aumenta seus bombardeios e não sabemos como reagir devidamente. Estamos despreparados. Contamos com pouco tempo para nos defender dos ataques e reverter o processo.

Ciclone extratropical no sul do Brasil

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