90 organizações e 72 deputados e senadores dizem ver “perigoso precedente” em presença de arapongas na conferência.
Noventa organizações da sociedade civil e 72 parlamentares enviaram na quinta-feira (29/10) uma carta à Secretária-Executiva da Convenção do Clima da ONU, Patricia Espinosa, cobrando providências sobre a presença de agentes da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência) espionando ambientalistas, diplomatas e congressistas na COP25, a Conferência do Clima de Madri, no ano passado.
No começo do mês, o jornal O Estado de S. Paulo revelou que quatro arapongas foram enviados para a COP25 para monitorar atividades de ambientalistas, em especial o chamado Brazil Climate Action Hub, organizado por ONGs brasileiras. Questionado, o General Augusto Heleno, Ministro do Gabinete de Segurança Institucional, ao qual a ABIN é subordinada, admitiu que mandou os agentes para espionar “maus brasileiros”. Heleno não especificou se os parlamentares e diplomatas que integravam a delegação e estiveram sujeitos à arapongagem também entravam na sua classificação.
Leia abaixo a íntegra da carta.
Brasília, 29 de Outubro de 2020
Sua Excelência Patricia Espinosa Cantellano
Secretária Executiva
Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas
Prezada Secretária Executiva,
Ficamos indignados ao descobrir por meio da imprensa que o governo do Brasil designou quatro agentes secretos para monitorar tanto as atividades da sociedade civil, quanto os próprios delegados do Brasil, durante a COP25 em Madri. Esses agentes receberam credenciais rosas de “Party” e amplo acesso às instalações das conferências e reuniões.
Depois que um grande jornal brasileiro divulgou a notícia, o ministro de Segurança Institucional do Brasil, que supervisiona a Agência Nacional de Inteligência (ABIN), admitiu que enviou agentes para monitorar “maus brasileiros”, e que continuaria a fazê-lo no futuro.
O caráter particular dos brasileiros, ou dos nacionais de qualquer outro país, é, naturalmente, irrelevante para a UNFCCC e seus processos. No entanto, a decisão de uma Parte (Estado) de espionar os delegados por qualquer motivo é extremamente preocupante. Viola a segurança dos delegados dentro das instalações da ONU, causando enorme constrangimento. Compromete a privacidade, o pensamento e o discurso da liberdade, e a imunidade consagrada na própria Carta das Nações Unidas. Também viola o código de conduta das reuniões da UNFCCC, que proíbe expressamente o assédio. É antiético e inaceitável.
A participação dos grupos constituintes e das organizações da sociedade civil nos processos da UNFCCC segue pressupostos de colaboração construtiva com as Partes e com a Secretaria, tanto dentro das salas de negociação, quanto nos corredores e eventos paralelos, para proporcionar um clima habitável para a humanidade.
A delegação brasileira presente na COP25, alvo do monitoramento de seu próprio governo, era composta, entre outros, de parlamentares e cientistas. Também participaram da reunião observadores da sociedade civil e representantes de povos indígenas. Estes, inclusive, reconhecidos dentro das resoluções da Convenção que os confere a salvaguarda de seus direitos, dada a importância estratégica de seus territórios e saberes tradicionais para garantir um mundo habitável para a humanidade. Como agravante, cabe registrar que a atitude do atual governo brasileiro ocorre em comunhão com uma série de outras iniciativas que atentam contra a democracia no país, como ameaças à imprensa, tentativas de intimidação de lideranças indígenas e sociais e redução dos espaços de participação da sociedade em instâncias governamentais, entre outros.
Ter agentes do governo sob crachás da UNFCCC nos espionando dentro das instalações da COP é uma situação extremamente constrangedora, criando um ambiente de intimidação e que prejudica os espaços de livre pensar que caracterizam as conferências de clima, caracterizando-se como um perigoso precedente. Contamos com o Secretariado da UNFCCC para agir de modo a evitar que esse abuso aconteça no futuro.
Respeitosamente,
ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE E COLEGIADOS:
Mobilização Nacional Indígena – MNI
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
Observatório do Clima
Articulação dos Povos e Organizações Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espírito Santo – APOINME
Articulação dos Povos Indígenas do Sul – ARPINSUL
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB
Coordenação das Organizações Indígenas da Bacia Amazônica – COICA
Amigos da Terra Amazônia Brasileira
Artigo 19
Associação Alternativa Terrazul
Associação Brasileira de Antropologia – ABA
Associação Cultural dos Realizadores Indígenas – ASCURI
Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida – APREMAVI
Associação de Mulheres Indígenas em Mutirão – AMIM
Associação do Movimento dos Agentes Agroflorestais Indígenas do Acre – AMAAIAC
Associação Nacional de Direitos Humanos, Pesquisa e Pós-Graduação – ANDHEP
Associação Terra Indígena Xingu – ATIX
Aty Guasu Guarani e Kaiowá
Centro de Defesa dos Direitos Humanos de Petrópolis – CDDH
Centro de Pesquisa e Extensão em Direito Socioambiental – CEPEDIS
Centro de Trabalho Indigenista – CTI
Comissão de Defesa dos Direitos Humanos Dom Paulo Evaristo Arns – Comissão Arns
Comissão Guarani Yvyrupa – CGY
Comissão Pró-índio do Acre – CPI-Acre
Comitê Brasileiro de Defensoras e Defensores de Direitos Humanos – CBDDH
Comitê Chico Mendes
Conectas Direitos Humanos
Conselho do Povo Terena
Conselho Indígena de Roraima – CIR
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Conselho Nacional de Ouvidorias Públicas
Coordenação Nacional de Articulação das Comunidades Negras Rurais Quilombolas – CONAQ
Engajamundo
Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional – FASE
Federação das Organizações Indígenas do Rio Negro – FOIRN
Federação dos Povos Indígenas do Mato Grosso – FEPOIMT
Frente Parlamentar Ambientalista
Frente Parlamentar em Defesa da Escola Pública e em Respeito ao Profissional da Educação
Frente Parlamentar Mista em Defesa dos Direitos dos Povos Indígenas
Frente Parlamentar Mista em Defesa da Soberania Nacional
Frente Parlamentar Mista pelos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável – ODS
Governos Locais pela Sustentabilidade – ICLEI
Greenpeace Brasil
Grupo Carta de Belém – GCB
Hutukara Associação Yanomami – HAY
Indigenistas Associados – INA
Iniciativa Verde
Instituto BV RIO
Instituto Catitu
Instituto Centro de Vida – ICV
Instituto Clima e Sociedade – ICS
Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável do Amazonas – IDESAM
Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos – IDDH
Instituto de Estudos Ambientais – Mater Natura
Instituto de Estudos Socioeconomicos – INESC
Instituto de Manejo Florestal e Certificação Florestal e Agrícola – IMAFLORA
Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia – IPAM
Instituto de Pesquisas Ecológicas – IPÊ
Instituto de Pesquisa e Formação Indígena – Iepé
Instituto Democracia e Sustentabilidade – IDS
Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social – ETHOS
Instituto Humanista para Cooperação e Desenvolvimento – Hivos
Instituto Internacional de Educação do Brasil – IEB
Instituto Maíra
Instituto Mulheres da Amazônia – IMA
Instituto Pólis
Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN
Instituto Socioambiental – ISA
Instituto Vladimir Herzog
Justiça Global
Kuñangue Aty Guasu
Movimento Nacional de Direitos Humanos – MNDH Brasil
Observatório dos Direitos Humanos dos Povos Indígenas Isolados e de Recente Contato – OPI
Observatório dos Direitos e Políticas Indigenistas – OBIND
Observatório de Protocolos Comunitários de Consulta e Consentimento Livre Prévio e Informado
Organização dos Professores Indígenas do Acre – OPIAC
Operação Amazônia Nativa – OPAN
Projeto Hospitais Saudáveis
Projeto Saúde e Alegria
Rede de Cooperação Amazônica – RCA
Rede GTA – Grupo de Trabalho Amazônico
Revista Xapuri
Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental – SPVS
SOS Amazônia
Teia Carta da Terra Brasil
Terra de Direitos
Uma Gota no Oceano
União das Mulheres Indígenas da Amazônia Brasileira – UMIAB
WWF Brasil
350 Brasil
DEPUTADOS FEDERAIS
Afonso Florence – PT/BA
Airton Faleiro – PT/PA
Alencar Santana – PT/SP
Alessandro Molon – PSB/RJ
Alexandre Padilha – PT/SP
Arlindo Chinaglia – PT/SP
Áurea Carolina – PSOL/MG
Beto Faro – PT/ PA
Benedita da Silva – PT/RJ
Bira do Pindare – PSB/MA
Bohn Gass – PT/RS
Camilo Capiberibe – PSB/AP
Carlos Veras – PT/PE
Célio Moura – PT/TO
Célio Studart – PV/CE
David Miranda – PSOL/RJ
Edmilson Rodrigues – PSOL/PA
Enio Verri – PT/PR
Érika Kokay – PT/DF
Fernanda Melchionna – PSOL/RS
Frei Anastácio – PT/PB
Glauber Braga – PSOL/RJ
Gleisi Hoffmann – PT/PR
Heitor Schuch – PSB/RS
Helder Salomão – PT/ES
Henrique Fontana – PT/RS
Ivan Valente – PSOL/SP
João Daniel – PT/SE
Joenia Wapichana – REDE/RR
Jorge Solla – PT/BA
José Airton Cirilo – PT/CE
José Guimarães – PT/CE
José Ricardo – PT/AM
Joseildo Ramos – PT/BA
Leonardo Monteiro – PT/MG
Lídice da Mata – PSB/BA
Luiza Erundina – PSOL/SP
Luizianne Lins – PT/CE
Marcelo Freixo – PSOL/RJ
Marcon – PT/RS
Margarida Salomão – PT/MG
Maria do Rosário – PT/RS
Nilto Tatto – PT/SP
Odair Cunha – PT/MG
Padre João – PT/MG
Patrus Ananias – PT/MG
Paulão – PT/AL
Paulo Guedes – PT/MG
Paulo Pimenta – PT/RS
Paulo Teixeira – PT/SP
Pedro Uczai – PT/SC
Perpétua Almeida PCdoB/AC
Professor Israel Batista, do PV/DF
Professora Rosa Neide – PT/MT
Rodrigo Agostinho – PSB/SP
Rogério Correia – PT/MG
Rui Falcão – PT/SP
Sâmia Bomfim – PSOL/SP
Talíria Petrone – PSOL/RJ
Túlio Gadêlha – PDT/PE
Vicentinho – PT/SP
Valmir Assunção – PT/BA
Vander Loubet – PT/MS
Waldenor Pereira – PT/BA
SENADORES
Fabiano Contarato – Rede/ES
Humberto Costa – PT/PE
Jacques Wagner – PT/BA
Paulo Paim – PT/RS
Paulo Rocha – PT/PA
Randolfe Rodrigues – REDE/AP
Rogério Carvalho – PT/SE
Zenaide Maia – Pros/RN
FONTE:
http://www.observatoriodoclima.eco.br/ongs-e-parlamentares-cobram-onu-por-espionagem-na-cop25/
29 – Outubro – 2020