Samyra Crespo || Ambientalista, coordenou a série de pesquisas nacionais intitulada “O que o Brasileiro pensa do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável” (1992-2012). Foi uma das coordenadoras do Documento Temático Cidades Sustentáveis da Agenda 21 Brasileira, 2002. Pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e Ciências Afins/RJ. Ex-Presidenta do Jardim Botânico do Rio de Janeiro
Comprei há tempos, em um sebo, um livrinho –
de “bolso” – do nosso ambientalista pioneiro Lutzenberger – cujo
título é Ecologia, do Jardim ao Poder. Uma coletânea despretensiosa e útil com
vários escritos do “Lutz”, como o chamávamos com carinho, escritos nos
anos 70′.
Um dos fundadores do movimento ambientalista brasileiro, chamou-me a atenção
ter incluído o “Jardim ” nas suas sustentações, quase sempre
centradas no problema dos agrotóxicos.
Deste livro lembro da frase: “Mesmo quando praticada em escala mínima, a
jardinagem restabelece um certo elo entre a natureza e o ser humano,
abrindo-nos os olhos para seus mistérios”. Sábio Lutz!!!
Há muitas matérias publicadas, hoje em dia, de várias tendências, recomendando
a jardinagem como terapêutica, parece que “sujar a mão de terra”
desestressa, relaxa, equilibra. Faz tempo a horta e a jardinagem são eficientes
métodos de educação ambiental nas escolas e de cura em clínicas de
rehabilitação mental.
Atualmente a jardinagem e a horticultura ganham novas vestes e atributos. Do
deleite solitário, ou até de resistência à selva de concreto que criamos, ela
vem ganhando uma eficácia diferente – como prática comunitária. É o que
observamos nos movimentos de vizinhos e amigos na feitura dos “jardins de
chuva” que se espalham por São Paulo e outras cidades: do concreto vão
surgindo pequenos pomares, plantas comestíveis, flores que atraem os
polinizadores. Espaços em que a terra reaparece e respira. Em muitos lugares do
mundo também rios e córregos estão sendo “desenterrados”.
Assim, os jardins “para enfeitar” ( o que já é um grande feito) vão
sendo substituídos por plantios mais conscientes, para regenerar. É bonito de
se ver. E o movimento cresce em campanhas para reflorestar.
Só que não é reflorestar com pinus ou eucaliptos para corte como
equivocadamentevo fizemos em décadas passadas. Mas reflorestar com os
principios da agrofloresta, da agroecologia, com plantas nativas, regeneradoras
das águas e do solo.
E a boa notícia é que não é preciso ter chácaras ou morar no campo. É possível
cultivar nos telhados dos prédios, nas varandas e áreas comuns. É possível
montar jardins para atrair borboletas e abelhas, contribuindo assim para que
não desapareçam.
Hoje vejo pessoas de todas as idades ter sua horta de temperos em janelas ou
pequenas varandas, e se emocionarem com os pequenos frutos, ou flores quando
surgem.
Há uma nova poética nesta busca do “elo” como diz Lutz. É a etica do
cuidado como nos lembra Boff. Somos nós, nos curando, resgatando a nossa
essência, e defendendo o Planeta com as delicadezas que foram esquecidas.