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CHOVE E OS MONSTROS SE CHAMAM: NEGLIGÊNCIA, IMPRUDÊNCIA  E IMPREVIDÊNCIA

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Nossa missão é semear informação ambiental de qualidade.

Samyra Crespo | Ambientalista. Ex-Presidenta do Jardim Botânico do Rio de Janeiro |

Uma semana chuvosa e ventosa nos aflige no Rio de Janeiro.

No alto do bairro da Glória, onde resido, a névoa cobre o morro do Pão de Açúcar e praticamente toda a baía. Durante toda a noite a chuva não poupou ruído e presença. Tudo está úmido e desconfortável. 

As notícias sobre estragos causados por ela não cessam: rádio, TV, redes sociais.

Quando digo que a chuva nos aflige, não é  uma metáfora.

Com ela, constante e acompanhada de ventos, há tantos dias, materializam-se as tristes imagens de deslizamentos, alagamentos, e desastres em escala cada vez maior e mais dolorida.

As chuvas de verão são como as “monções” na Índia: sazonais e implacáveis, aqui marcadas, até há pouco tempo, pelos temporais de verão.

Mas nem entrou o famigerado verão e a chuva já causa estragos consideráveis em boa parte do país. Quando não é o El Niño, é La Niña, os sistemas de baixa pressão e outras explicações que em geral “a moça do tempo” nos dá.

Há três  décadas, pelo menos, os cientistas vêm alertando sobre as mudanças climáticas. 

Há  pelo menos três décadas, seguramente desde o início dos anos 90′ se fala do que já se concretizou: chuvas intensas, torrenciais, com mais frequência. Chove mais e mais forte.

Há mais gente nas cidades, habitando encostas e fundo de vales. Mais desastres à vista, vitimando uma população cada vez maior.

Esta realidade só vai piorar nos próximos anos.

O que os governos, autoridades e lideranças estão fazendo?

Onde estão as providências? Além de abrigar pessoas em estádios e escolas, pedir por nossa solidariedade e maldizer a sorte?

No início da década de 2.000 já se falava de “mitigação” (redução dos danos) e prevenção (evitar riscos desnecessários).

A ONU HABITAT, agência das Nações Unidas que se ocupa das cidades, desenvolveu uma metodologia de “alerta temprano” (antes que o fenômeno extremo aconteça) com o mapeamento de áreas de risco e identificação tanto de responsabilidades no âmbito governamental.

Estimativas de obras e recursos necessários.

Tive oportunidade de participar deste esforço que reuniu o MMA, e sua extinta Secretaria de Qualidade Urbana (gestão do Ministro Sarney Filho), IBAMA com o seu Relatório de Qualidade Ambiental (que parou de fazer há  mais de 15 anos, não se sabe por quê) e pela sociedade civil o ISER e o IBAM (Instituto Brasileiro de Administração Municipal).

O objetivo do programa GEO CIDADES era claro.

Não houve contudo interesse maior das autoridades brasileiras.

O ICLEI, instituição mandatada para ajudar os municípios a implementar programas voltados para reduzir danos causados pelas mudanças climáticas, vai na mesma direção, mas o número de municípios que aderem a seus programas ainda é muito pequeno. 

Enquanto isso, seguimos como “vítimas” – lamentando o azar. Ou a “inclemência” da natureza.

Em muitos países, como os EUA por exemplo, a população é treinada para ajudar em desastres (devido à  grande ocorrência de tornados e furacões) aqui um indivíduo não sabe acionar sequer um tanque de oxigênio. 

Delegamos essas tarefas à defesa civil, aos bombeiros e agimos todos que nem crianças que nada sabem fazer.

Amigos e amigas, a situação é clara.

A caixa de Pandora foi aberta por nós mesmos.

As profecias se realizaram: os monstros se chamam negligência, imprudência e imprevidência.

Não há  outro jeito senão recuperar esforços como as metodologias de prevenção de desastres – agora mais sofisticadas e apoiadas por tecnologia de última geração. 

Exigir que os relatórios de qualidade ambiental urbana sejam retomados.

Treinar a população para enfrentar desastres, incentivar equipes de voluntários. 

Estamos vivendo tempos excepcionais. 

Entender isso vai diminuir sofrimento futuro e dar mais sentido a esse presente que nos parece tão difícil. 

As soluções não são simples, mas existem.

E agora que a área ambiental vai ser recuperada do desmonte recente, sob “nova direção”’, é preciso olhar com urgência não só  o que faremos com as florestas, mas também com as cidades.

Afinal, nelas vive a maior parte da população brasileira.

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