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Marajó Resiliente: mulheres, quilombolas e juventudes na linha de frente da COP30

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Lúcia Chayb Diretora eco21.eco.br @eco21_oficial @luciachayb luciachayb@gmail.comPor trinta anos foi a jornalista responsável pela revista ECO21 (1990/2020)

Projeto Marajó Resiliente fortalece agricultoras, agricultores familiares e comunidades tradicionais no enfrentamento à crise climática na Amazônia Paraense

No maior arquipélago flúvio-marítimo do mundo, localizado na região amazônica do Pará, comunidades tradicionais quilombolas, agricultoras e agricultores familiares vêm mostrando que a resposta à crise climática pode vir das margens, ou melhor, das raízes. O projeto Marajó Resiliente, que já beneficiou diretamente mais de 1.130 pessoas e 14.428 indiretamente, atua de forma integrada nos municípios de Soure, Salvaterra e Cachoeira do Arari, promovendo resiliência climática territorial por meio de ações estruturadas em diálogo com os saberes locais e as urgências do nosso tempo, com realização da Fundación Avina e financiamento do Fundo Verde do Clima (Green Climate Fund – GCF) o projeto, executado com outras organizações parceiras, apoia as comunidades locais aliando os saberes locais as tecnologias de adaptação climática, pensando na sustentabilidade das populações tradicionais. 

Em um ano marcado pela realização da 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30) em Belém (PA), o Marajó Resiliente se destaca como uma das experiências mais representativas da Amazônia no campo da adaptação climática liderada por comunidades. A iniciativa compartilha soluções construídas a partir da escuta e da vivência cotidiana dos territórios, evidenciando a urgência de fortalecer políticas públicas que priorizem investimentos em projetos de adaptação climática, especialmente voltados às regiões insulares e comunidades tradicionais, esses os territórios mais vulneráveis aos impactos da crise do clima.

“O projeto se ancora na ideia de multiplicação, reconhece e valoriza saberes e práticas, conhecimentos tradicionais que as populações já tem, a ideia é que isso seja multiplicado a partir das lógicas tradicionais de repasse, de construção de conhecimento de geração para geração, mas também que possa fortalecer espaços educacionais voltados para  agricultura familiar que já existe no município, fortalecer a cooperativas, associações, organizações locais que possam expandir a ideia de implantação de sistemas diversificados para os seus cooperados, para os seus associados.” Conta Lanna Peixoto, coordenadora do projeto pela Fundación Avina.

Em um cenário de secas prolongadas, salinização do solo, marés lançantes e erosão costeira, o Marajó Resiliente apresenta alternativas concretas para fortalecer a produção local, conservar a biodiversidade e garantir segurança alimentar às famílias marajoaras. Estudos da Universidade Federal do Pará e do Instituto Nacional de Metereologia (INMET) alegam que nos últimos 20 anos, o Marajó tem vivenciado reduções significativas na precipitação durante a estação seca (agosto a dezembro), intensificando os períodos de estiagem e afetando diretamente as as produções de agricultores locais. E em relatório técnico a Emater-Pará (2023) revelou que comunidades quilombolas de Salvaterra e Soure perderam até 40% da produção de mandioca e milho nas últimas três safras devido à combinação de seca, salinização e erosão dos talhões produtivos colocando em risco assim a sustentabilidade financeira e alimentar dessas comunidades.

Resultados e avanços no território

Desde seu lançamento, o projeto Marajó Resiliente já avançou em ações estratégicas que evidenciam seu potencial transformador. Entre os destaques estão a implantação das primeiras unidades demonstrativas de Sistemas Agroflorestais Diversificados (SAFs), com foco na recuperação ambiental e geração de renda, e a formação de multiplicadoras e multiplicadores de saberes agroflorestais, valorizando práticas ancestrais de cultivo.

SAFs, ou Sistemas Agroflorestais, são formas de uso da terra que combinam o cultivo de espécies agrícolas, frutíferas e florestais no mesmo espaço, de maneira integrada e sustentável. Eles buscam imitar a dinâmica natural das florestas, promovendo a recuperação ambiental, a produção de alimentos e a geração de renda para comunidades locais, ao mesmo tempo em que conservam o solo, a água e a biodiversidade, conduzindo assim técnicas de adaptação climática a situações da crise do clima como secas e enchentes.

Das 1.130 pessoas beneficiadas pelo projeto diretamente, 59,2% são mulheres, além disso, o projeto envolveu 20 comunidades quilombolas locais em suas atividades contribuindo  a melhoria do manejo da terra através de Sistemas Agroflorestais diversificados (SAF’s) gerando diversificação de renda de agricultores familiares por meio da implementação de SAFs diversificados.

Para Tiago Alves, multiplicador do projeto e agricultor familiar da comunidade do Pedral, em Soure, o projeto se apresenta como uma oportunidade de crescimento e conhecimento para suas práticas de plantio e agricultura, para ele: “Antes de conhecer o projeto eu plantava sem calcário, tocava fogo em toda a matéria orgânica que acreditava ser lixo, mas não é lixo, porém hoje com o conhecimento adquirido do projeto a produtividade da minha área é uma maravilha.”

Também foram realizadas oficinas de comunicação com juventudes, fortalecendo jovens como comunicadores populares, e estruturados Comitês Comunitários de Governança Climática com representações femininas, quilombolas e de juventudes. O projeto iniciou ainda a articulação para acesso a crédito rural e apoio a cooperativas, criando bases para a sustentabilidade econômica local.

Carla Campos, multiplicadora e agricultora familiar da comunidade de Soledade, de Cachoeira do Arari, fala da importância dos SAFs na diversificação de renda, utilizando da técnica é possível plantar mais de uma espécie: “Ele é bom porque quando eu tô esperando o açaí, eu já estou tirando o cupuaçu. E como a gente pode plantar entre-linhas milho, mandioca, batata, feijão. Quando eu tô esperando sair o açaí, já estou colhendo outro, já dá para sobreviver, me manter.

Marajó na rota da COP30

Em maio de 2025, o projeto foi apresentado na 19ª Conferência Internacional Sobre  Adaptação Climática por Comunidades (CBA19), em Recife, evento realizado pela primeira vez na América Latina. Na ocasião, Valéria Carneiro, quilombola de Salvaterra, levou a experiência do projeto ao debate global, reforçando a urgência de reconhecer os saberes tradicionais como base da resiliência climática. Valéria também alertou sobre a necessidade de desburocratização do acesso a recursos climáticos para organizações de base.

Com a proximidade da COP30, a ser realizada em Belém , o Marajó Resiliente se consolida como uma experiência estratégica a ser apresentada nos espaços oficiais e paralelos da conferência, demonstrando que é possível construir políticas e ações climáticas enraizadas no território, com protagonismo das comunidades amazônicas.

“A COP30 é uma momento super importante para posicionar o projeto, tanto para apresentar dados, mas também para fomentar discussões em torno da acessibilidade e apoio do financiamento climático as comunidades tradicionais, dos sistemas agroflorestais como possibilidade de enfrentamento às mudanças climáticas como uma medida de adaptação climática.”, afirma Lanna Peixoto.

Sobre o projeto Marajó Resiliente

O Projeto Marajó Resiliente é uma iniciativa dedicada a fortalecer a resiliência climática de agricultoras, agricultores familiares e comunidades tradicionais do arquipélago do Marajó, no Pará. Atuando nos municípios de Cachoeira do Arari, Salvaterra e Soure, o projeto busca fortalecer estratégias de adaptação climática a partir do território, aliando saberes locais, práticas agroecológicas e assistência técnica especializada.

A iniciativa é realizado pela Fundación Avina, em colaboração com o Instituto Belterra e o Instituto Conexsus, com a implementação do Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB), da World-Transforming Technologies, da Apó Socioambiental e da Angola Comunicação, nos processos de comunicação, e  é financiado pelo Fundo Verde do Clima (Green Climate Fund – GCF) e Climate and Land Use Alliance (CLUA).

Sua base está na adaptação climática, implantação de sistemas agroflorestais, acesso a crédito rural, diversificação de renda, e fortalecimento da governança climática local. Ao longo de cinco anos, o projeto foi elaborado  de forma participativa, envolvendo comunidades quilombolas, organizações locais e instâncias públicas. E sua execução prevê cinco anos de atuação em Cachoeira do Arari, Salvaterra e Soure, no arquipélago do Marajó. 

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