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Samyra Crespo |

Marina Silva no seu segundo mandato e o terceiro de Lula.

Consagrada e querida, respeitada e visionária, tudo isso a Marina Silva é. 

E sua fala “vamos liderar pelo exemplo” tem lastro em sua cantada e decantada integridade.

Reconduzida ao Ministério, agora batizado de Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, 20 anos depois de ali chegar como a primeira ministra socioambientalista da história do Órgão, vem em andores de uma posse concorrida e simbólica: afinal, a pasta que assume foi uma das mais degradadas na gestão de Ricardo Salles, sob as ordens daquele que partiu ou fugiu, na maior e mais covarde investida contra os vulneráveis desse país. 

Lembro bem que publiquei no Jornal O Globo, na parte de opinião, um artigo em que afirmava que o socioambientalismo, corrente minoritária no ambientalista mundial (majoritariamente conservacionista até  então) chegava ao poder.

20 anos atrás. 

Poder esse que se expressou nos dois mandatos de Lula, com respectivamente Marina Silva  e Carlos Minc  na pasta do Meio Ambiente.

Com Izabella a toada mudou: entrou forte a questão do clima, a implementação dos acordos setoriais da Lei Nacional de Resíduos Sólidos e a longa discussão do Código Florestal. Internacionalmente, o Acordo de Paris e a Rio + 20 catapultaram o prestígio do Brasil no inverso dos tratados.

Os mecanismos de participação foram preservados, e então pode-se dizer que a “inclusão  política” foi uma estratégia fortalecida pelo menos durante todo o período em que o PT comandou o governo e a pasta. Izabella, mesmo não sendo petista, mas uma técnica de carreira do IBAMA, foi indicada por Lula, e a maioria dos secretários quando lá  cheguei em 2008, eram quadros petistas.

20 anos se passaram, desde a chegada da Marina e pelo menos 6 anos desde o início do desmonte sistemático.

Há  que reconstruir uma parte e inovar em outra.

O Brasil e o mundo mudaram e a ‘fila andou’ um bocado – nem sempre na direção certa.

Na reconstrução, restabelecer os mecanismos de participação, repor quadros e funções nos dois institutos mais importantes da estrutura executiva do MMA, Instituto Chico Mendes e IBAMA. Trazer de volta o Serviço Florestal.

A inovação vem no redesenho da estrutura do combate ao desmatamento e no foco nas mudanças climáticas  – que irá merecer além do redesenho, programas robustos.

O combate ao desmatamento, prioridade número um no Brasil bastante diferente de 20 anos atrás.

Os desafios para deter a bandidagem e a ilegalidade são imensos.

Marina Silva  deve ser louvada pela coragem.

Sabe que a pauta ambiental, para além do glamour superficial, é  sempre negativa: gera expectativas altas no curto prazo, mas entrega resultados no médio e longo prazo. 

Além  disso, é  monitorado por segmentos ativistas combativos e muitas vezes concorrentes.  As novas pastas do governo, como a dos ‘povos originários ‘, por exemplo, e a da pesca, serão demandantes e concorrentes.

Imaginar que o governo, com tal diversidade e miríades de interesses, vai ser regido sob uma nova ordem colaborativa, é  ingenuidade.

A tal ‘transversalidade’ é  um ativo imaterial e estranho à  política brasileira.

Longe de nós pensar que a Marina, madura e mais experiente é  ingênua.  

Todo visionário, e ela o é, nos contagia com sua graça e loucura. A loucura boa, que ousa acreditar.

Assim, eu que por lá fiquei 6 anos, do final do mandato do segundo governo de Lula e durante todo o mandato de Dilma (trabalhando tanto com  Carlos Minc, quanto com Izabella Teixeira), sei bem que não existem DASs (remuneração e gratificações) nem dinheiro no orçamento suficientes para provisionar tantos cargos, habilidades, especialidades e ‘companheiros’.

A criação do Instituto Chico Mendes viabilizou-se, no passado,  quebrando as pernas do IBAMA e criando uma fissura que durou mais de uma década. 

O redesenho do MMA me passa uma impressão de gigantismo e de ‘tribalismo’ nas agendas.

Temo por isso.

Mas vamos aguardar os quadros que serão escolhidos para executar as difíceis tarefas à  frente.

Concluindo,  Marina empolga com sua força, disposição e vontade de acertar.

Só  nos resta, além de torcer,  ajudar.

Há uma grande convocação nesse mandato de Lula, que se ramifica nas várias agendas.

Superar o trauma dos últimos 6 anos, arregaçar as mangas, unir e reconstruir. 

Marina e o novo Ministério sob sua orientação, são alentos nada desprezíveis. 

Sigamos juntos e misturados.

Samyra Crespo – Foto: Lúcia Chayb / Eco21

Samyra Crespo | Ambientalista, coordenou a série de pesquisas nacionais intitulada “O que o Brasileiro pensa do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável” (1992-2012). Foi uma das coordenadoras do Documento Temático Cidades Sustentáveis da Agenda 21 Brasileira, 2002. Pesquisadora sênior do Museu de Astronomia e Ciências Afins/RJ. Ex-Gestora do Jardim Botânico do Rio de Janeiro.

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