O Cerrado e o Pantanal bateram recordes e registraram, no primeiro semestre deste ano, a maior quantidade de focos de incêndio desde 1998, início da série histórica de dados do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) sobre focos de queimadas no país.
No Cerrado, já são 20.692 focos de incêndio desde o começo do ano até o final de julho. Na comparação com o mesmo período de 2023, o aumento foi de 23%. Do total das áreas atingidas, 53% ficam na região conhecida como Matopiba, que engloba Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia e é a principal fronteira da expansão agrícola do Brasil.
No Pantanal, a quantidade foi de 4.756 focos entre 1º de janeiro e 31 de julho. O número representa um aumento de 1.500 % em relação ao registrado no mesmo período do ano passado, segundo dados do Inpe.
“O fogo ainda é uma ferramenta importante utilizada na agropecuária brasileira. Grande parte das pastagens no Brasil tem seu capim renovado com o uso do fogo,
assim como as queimadas são a principal forma de transformação da biomassa derrubada pelo desmatamento facilitando a conversão da floresta em áreas de cultivo ou pastagem. O grande problema é quando essas queimadas ultrapassam o limite desejado e viram incêndios. Infelizmente esse cenário está ficando cada vez mais comum principalmente por conta das mudanças climáticas”, destaca Ane Alencar, diretora de Ciência do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM).
Lívia Moura, geógrafa e assessora técnica do Instituto Sociedade, População e Natureza (ISPN), completa: “Desde que os humanos aprenderam a controlar o fogo, ele é parte essencial da nossa existência, tem papel cultural na produção agropecuária e no manejo de ambientes para evitar incêndios. O fogo bem planejado é muito útil e eficaz para evitar incêndios em campos e savanas, como no Cerrado, nos campos sulinos e amazônicos e no Pantanal”.
Especialista em Manejo Integrado do Fogo (MIF), Lívia destaca que a abordagem é fundamental para diminuição dos incêndios no Pantanal e no Cerrado. O manejo considera o bom planejamento, execução e monitoramento de queimadas controladas em locais estratégicos. Essas queimas criam mosaicos com diferentes históricos de queima na paisagem, como uma colcha de retalhos, em que cada pedaço tem uma qualidade e quantidade de combustível (capim seco) diferente. Muitos não têm combustível suficiente para que um incêndio continue, outros têm uma vegetação mais arbórea e úmida onde o fogo dificilmente se propaga. Assim, milhares de quilômetros deixam de queimar por não haver continuidade de combustível, ou condições favoráveis, diante da primeira descarga elétrica, ou pior, e mais comum, o primeiro isqueiro.
No Cerrado, outra ferramenta importante para controle do fogo é a Plataforma Suindara – Sistema de Alertas de Fogo e Desmatamento, desenvolvida pelo Instituto Cerrados, que coleta dados de focos de calor disponibilizados pelo Inpe e pela Nasa e direciona-os diretamente para os celulares dos usuários cadastrados, filtrando a informação de acordo com cada território. Já são mais de 150 usuários monitorando 5 milhões de hectares no Cerrado.
“O Programa Suindara compreende que enviar os alertas é um passo importante, mas inicial para que as ações de prevenção e combate sejam efetivas e seguras. Por isso, buscamos fornecer outras competências aos gestores do fogo, por meio de oficinas, capacitações, formações e doações de equipamentos de proteção individual e de combate”, diz Yuri Salmona, diretor-executivo do Instituto Cerrados.