Seminário Nacional do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental 2020
O Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental – FMCJS – é uma articulação de Entidades, Pastorais e Movimentos Sociais que atuam em rede para gerar consciência crítica e enfrentamento em relação a tudo que causa o aquecimento da Terra e vai tornando mais perigosas as mudanças climáticas, de modo especial para os povos, comunidades e pessoas que as sociedades capitalistas jogam na marginalização e na miséria.
Atua em âmbito nacional e se faz presente nos biomas e territórios por meio das entidades membros e de outras entidades parceiras, promovendo a convivência com cada bioma e ecossistema por meio de práticas que anunciam e vão construindo sociedades de Bem Viver.
Está aberto à participação de outras iniciativas e ou parcerias que tenham afinidade com seus objetivos e assumam seu documento político.
Carta pública
Nós, participantes do Seminário Nacional do Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental, reunidos virtualmente de 1 a 4 de dezembro de 2020, representando as cinco regiões do Brasil (Norte, Nordeste, Centro Oeste, Sudeste e Sul) e os biomas Amazônia, Caatinga, Cerrado, Mata Atlântica, Pantanal, Pampa e Zona Costeira, em meio à falência e a derrocada total do projeto neoliberal em curso, fundado nos interesses do capital, da ganância e da destruição do nosso patrimônio planetário, reafirmamos nosso compromisso de luta pela construção de um projeto político amplo, alternativo, democrático e popular para nosso país.
Entendemos que o projeto que pretendemos construir, coletivamente, deve partir de uma ampla reconexão com as nossas raízes culturais e com os nossos modos de vida ancestrais. O projeto neoliberal de desenvolvimento que nos foi imposto não nos serve porque pactua com a morte, cada vez mais próxima da vida na Terra. Do nosso lado, reiteramos nosso pacto com a defesa de todas as formas de vida presentes em nossa Mãe Terra.
Não abrimos mão dessa construção coletiva em favor da vida, porque acreditamos numa visão sistêmica da Terra, como na proposta de Desenvolvimento Integral trazida pelo Papa Francisco. Essa proposta e outras perspectivas, que nos inspiram, reforçam a certeza de que as mudanças climáticas só podem ser contidas com a ruptura sistêmica do modo capitalista de produção e consumo.
Há uma íntima relação do fundamentalismo, de tipo político, religioso, ambiental, cultural e racial com a emergência climática e os danos socioambientais. Por isso, as mudanças climáticas devem ser pensadas de forma conectada com as lutas antirracistas, da relação intergeracional e pela igualdade de gênero. Nesta perspectiva, repudiamos as políticas de genocídio dos povos negros, indígenas, a destruição da nossa cultura e os frequentes ataques ao Direito à Informação. Denunciamos as agressões inaceitáveis à cidadania brasileira, a repressão política, como é o caso do recente “Mapa de Influenciadores”, produzido pela empresa BR+ Comunicação, por R$ 2,7 milhões e usado pelo Ministério da Economia, que traz a lista completa dos jornalistas e formadores de opinião, “detratores” do bolsonarismo. Esse é mais um exemplo de métodos inaceitáveis de perseguição e cerceamento de liberdades.
As respostas às mudanças climáticas e ao racismo ambiental devem partir de alternativas populares e anticapitalistas, pois não é possível esperar uma resposta daqueles que se sustentam na lógica individualista antropocêntrica, que impõe a visão do ser humano como foco central da realidade, em competição entre si, pela busca incessante dos lucros advindos da exploração humana e dos Bens Comuns. Estes dias de seminário nos presentearam com uma rica e diversa gama de boas práticas de enfrentamento das mudanças climáticas, inspiradas na filosofia do Bem Viver, calcadas na sabedoria da ancestralidade e nas estratégias históricas de resistência dos povos das águas e das florestas, como forma capaz de alterar esta realidade rumo a uma nova convivência harmônica com a Terra e todos os seres vivos.
Entre estas vivências, destacamos: a luta pela reforma agrária; a prática da agroecologia, a agricultura urbana, a segurança e soberania alimentar, livre de agrotóxicos e transgênicos; o enfrentamento aos megaprojetos de morte trazidos pelo modelo de desenvolvimento atual; as dietas veganas, vegetarianas ou com drástica diminuição da proteína animal; o reconhecimento e a valorização dos saberes e modos de vida dos povos e comunidades tradicionais; e a transição para energias renováveis, de menor impacto, justas e populares.
Considerando que os megaprojetos do chamado desenvolvimento, como a mineração, a siderurgia, a energia nuclear, os parques eólicos, as fazendas solares, o hidro e o agronegócio, são os principais responsáveis pela degradação ambiental, violação de direitos e emissão de gases de efeito estufa, entendemos que são fundamentais as lutas contra a instalação e funcionamento desses projetos devastadores dos territórios. É importante destacar que os principais responsáveis pela emissão de CO2 no mundo são as queimas dos combustíveis fósseis. Ressaltamos também que a lógica dos megaprojetos por si só é devastadora, e as alternativas energéticas apenas fazem sentido se construídas em formatos populares, com respeito integral aos territórios.
Nesse sentido, entre as estratégias de luta, destacamos também: denúncias judiciais, em instâncias nacionais e internacionais, das corporações e dos representantes políticos responsáveis pelos danos das mudanças climáticas; articulação pelos direitos da natureza; articulações de luta contra os megaprojetos; experiências de recaatingamento e de combate à desertificação que atinge todos os biomas do Brasil.
Como Fórum Nacional Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental, reafirmamos o nosso compromisso de articulação, luta, informação e formação, denunciando qualquer prática que venha agravar a concentração de riquezas, o racismo, o machismo, a desigualdade social e as agressões aos direitos da Mãe Terra.
Brasil, 4 de dezembro de 2020