Samyra Crespo | Ambientalista. Ex-Presidenta do Jardim Botânico do Rio de Janeiro
O Jardim Botânico pode ser considerado, por suas características, um “museu a céu aberto”: suas alamedas e recantos, palmeiras e árvores centenárias, bem como as edificações – quase todas com valor histórico. Os chafarizes artísticos e monumentais, as esculturas do Mestre Valentim, tudo ali tem história pra contar. Os casarões têm diferentes idades e arquitetura eclética, mas são tombados e testemunhas de um tempo ido. Além disso há equipamentos, mobiliário e um sem número de peças de valor que são a memória material da Instituição. Ainda assim e numa concepção de que não se pode parar no tempo, Lizst Vieira, advogado e ex-deputado ambientalista, que esteve à frente do Jardim por 10 anos, quis deixar a sua marca criando um “corredor cultural”, com teatro, cineclube, espaço de exposição e finalmente um Museu do Ambiente. Em princípio, a ligação entre cultura e meio ambiente é benfazeja e necessária. E quem não gosta de cineclube, de teatro e de museu bonito? Ocorre que essa “demiurgia” tem limite: regulamento na utilização do espaço, o orçamento (dinheiro para fazer e manter) e gente, quadros técnicos para dirigir, coordenar etc tais iniciativas. Aí começam os problemas. Para o dinheiro você busca patrocínio, para gente você recorre à terceirização – e aí se criam duas instituições paralelas, uma pública, oficial, com cargos e dinheiros definidos e outra que depende de um fluxo inconstante e incerto de patrocínios e doações. Ainda por cima, todo ingresso oficial de recursos tem que ir para o Tesouro. Deu para entender o tamanho da complicação? Assim, foi-se criando no Jardim – fato consumado – uma estrutura que demanda recursos que o orçamento não permite. Mexer no orçamento depende de negociações com a SOF (responsável pela determinação dos limites de orçamento no Ministério do Planejamento) e de complexos trâmites. Não dá para explicar aqui, mas não é simplesmente mandar um bilhete para Brasília pedindo grana. Mas dá para explicar aqui que a estrutura que foi criada – incluindo o Museu, não se sustenta com o orçamento e número de cargos e quadros técnicos atuais. Assim, a busca de patrocínios e de parcerias tipo público-privada é uma saída lógica e razoável. Optar por terceirização não é em si um mal. Pude por exemplo ver com meus próprios olhos que o Grupo Cataratas à frente do nosso Parque do Iguaçu faz um excelente trabalho. Também a recente experiência com o Parque do Ibirapuera parece outro exemplo que vai bem. Então, buscar apoios privados para o Jardim Botânico é algo legítimo e necessário – ainda mais em tempo de recursos públicos escassos. O que não parece lógico nem razoável são opções que nada têm a ver com a vocação do Jardim Botânico e que me cheiram a “balão de ensaio”, tal é a estatura da bizarrice da construção de um “hotel boutique” no casarão do Museu. Um hotel na entrada do Jardim? Numa rua conhecida por engarrafamentos eternos? Que alaga sazonalmente, transformando-se num rio a céu aberto, inclusive ameaçando a integridade do próprio Jardim? Sem área para estacionar? Poderia listar todo o descalabro que significa esta idéia. Mas por que perder tempo com isto quando há tantas coisas belas e defensáveis esperando no Jardim Botânico do Rio de Janeiro por nossa atenção? Quanto ao Museu do Ambiente, propriamente dito – este tem sim problemas de institucionalização que devem ser solucionados. Faz parte do “job” de quem assume a função de dirigente. A ajudinha extra que tentei obter na minha gestão com a instituição de um Conselho de especialistas – que incluía museológos e gestores de museus cientificos e espaços de ciência – foi desconsiderada e o Conselho (trabalho voluntário) foi extinto por Sergio Besserman meu sucessor. Quando essa nova turma chegou só encontrou o problema. Resumindo e fechando: ser gestor de bens culturais e ambientais públicos não é para amadores. Quanto a nós, cidadãos e usuários, só nos mobilizamos para apagar incêndios – e olhe lá. Mas esta é uma outra história. O atual Ministério do Meio Ambiente – que ao final e ao cabo é o responsável pelo Jardim não tem primado por decisões acertadas nem por gestão competente. Vivemos aos sustos.