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Resíduos sólidos urbanos, uma oportunidade sustentável para geração de energia

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No contexto do PDE 2031 surge o aproveitamento dos chamados Resíduos Sólidos Urbanos (RSU’s), pouco explorados diante do potencial do país para a geração de energia com base no lixo e no esgoto

Wagner Victer | Engenheiro, Administrador, Ex-Secretário de Estado de Energia, Indústria Naval e do Petróleo e Ex-Conselheiro do CNPE

A discussão pela qual passa o Brasil na elaboração do seu novo Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE 2031), coordenado pelo Ministério de Minas e Energia e em consolidação pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), oferece reflexões sobre ações para o futuro, em especial quanto a oportunidades energéticas associadas à sustentabilidade ambiental.

Nesse contexto surge o aproveitamento dos chamados Resíduos Sólidos Urbanos (RSU’s), pouco explorados diante do potencial que temos para a geração de energia com base em origens como, por exemplo, o lixo e o esgoto, especialmente o lodo retirado nas estações de tratamento de esgoto. É importante destacar que desde 2010 existe um marco direcionado ao tema, que é a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), além de um processo normativo de classificação de resíduos, fixado na Norma ABNT NBR 10004:2004.

Essa filosofia vai ao encontro de uma grande tendência mundial e, além dos ganhos de sustentabilidade, há outros, como o alívio para os chamados aterros sanitários, muitas vezes não tão próximos dos grandes centros urbanos e que geram uma logística inadequada, com um fluxo significativo de veículos.

De 2010 a 2020, a produção de lixo no país cresceu da ordem de 11%, com produção atual superior a 70 milhões de toneladas por ano e previsão de chegar em 2030 a 100 milhões de toneladas por ano. Estima-se que somente 50% desse lixo é direcionado aos aterros sanitários. Ainda segundo estimativas, há um potencial de aproveitamento de 4 GWs para geração elétrica com os resíduos gerados no país, o que é superior ao parque de geração nuclear existente e em implantação nas usinas de Angra I, II e III.

No âmbito do campo também já existe uma elevada disponibilidade de resíduos agropecuários que, muitas vezes, têm sido utilizados e aproveitados em diversas localidades. A utilização do sebo bovino – muito usado na produção de biodiesel, como também a própria vinhaça e outros produtos na produção do biogás – começam a dar passos importantes.

Os RSU’s, especialmente o lixo e os produtos derivados do esgoto, têm um diferencial positivo para aproveitamento nos grandes centros urbanos, onde também há demanda elétrica significativa o que, logicamente, favorece esse tipo de geração.

Durante o período em que fui presidente da Companhia Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (Cedae), desenvolvemos um projeto com a Coppe UFRJ – Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia, da Universidade Federal do Rio de Janeiro -, por meio do professor Luciano Bastos, para a construção, na Estação de Tratamento de Alegria, no bairro do Caju, de uma planta piloto na qual fazíamos a extração do biodiesel da chama escuma sobrenadante do esgoto, altamente rica em óleos, e também utilizávamos resíduos sólidos de esgoto (lodo), rico em compostos orgânicos, para a produção de energia. Hoje, esse lodo é qualificado como adubo orgânico e aplicado em projetos de reflorestamento.

Na ocasião, o projeto da Cedae ganhou repercussão nacional por seu pioneirismo. Investimos valores importantes para que essa planta piloto ganhasse dimensão e parâmetros comerciais para futuros sistemas maiores. Tenho certeza de que a nova concessionária, a Águas do Rio, saberá dar continuidade a esse processo.

Voltando as RSU’s: a produção de biogás, através de pequenos biodigestores distribuídos, também reduzirá muito o envio de componentes para lixões ou aterros sanitários, além de ser um produto muito rico no seu resíduo final para utilização como biofertilizantes.

Os compromissos globais para redução de metano, assinados pelo Brasil durante a COP 26, estabelecem que esse processo não só é relevante como também substituirá algumas fontes de utilização do gás natural, como o gás natural veicular (GNV). Além disso, essas ações se alinham aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU, em especial no Tema 11 (Cidades e Comunidades Sustentáveis).

O próprio PDE 2031, na sua versão disponibilizada em audiência pública, reconhece como sendo uma oportunidade socioambiental estratégica o “aproveitamento energético de resíduos”, por ser uma chance de substituir fontes não renováveis e também por contribuir para a redução de emissões, além de aumentar a eficiência dos processos produtivos e a otimização em recursos de infraestrutura, o que permite um aproveitamento melhor dos recursos energéticos e, consequentemente, a amenização de impactos socioambientais.

Nessa linha, grandes projetos de geração de energia no Brasil – dentro dos recursos financeiros compulsórios que são segregados e direcionados para fontes alternativas e não convencionais – devem focar uma atenção especial para o aproveitamento dos RSU’s, que podem ganhar escala com o desenvolvimento de uma indústria local ao se inserirem em nossa matriz energética, trazendo ganhos em externalidades socioambientais bastante necessários para o futuro.

Wagner Victer é

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