Herton Escobar || Jornalista do Jornal da USP
Pesquisadores refletem sobre dez anos de pesquisa e discutem estratégias para avançar no conhecimento e no convencimento da sociedade sobre as ameaças do aquecimento global.
O recado da ciência é claro e já vem sendo dado há algum tempo: o aquecimento global é um problema real, causado pelo homem, com consequências climáticas gravíssimas, e que precisa ser atacado com urgência por todos os países, pelo bem da humanidade.
Mas nunca é demais repetir, o que muitos parecem não querer ouvir: “Estamos numa situação de emergência planetária, ponto”, diz o especialista Paulo Artaxo, professor do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP) e co-coordenador do Programa FAPESP de Pesquisa sobre Mudanças Climáticas Globais, que recentemente completou dez anos e agora busca renovar sua agenda de pesquisa para a próxima década.
Criado em agosto de 2008, o programa multiplicou por cinco os investimentos da FAPESP em pesquisas sobre mudanças climáticas, de uma média de aproximadamente R$ 4 milhões por ano até 2007, para mais de R$ 20 milhões anuais, desde 2008. O resultado foi um aumento igualmente expressivo da produção científica paulista sobre o tema, de aproximadamente 15 artigos publicados por ano em 2007 para 280 artigos, em 2018; grande parte deles feita em parceria com pesquisadores de outros Estados e países.
“Uma característica dessa área é que ela envolve muita colaboração”, destacou o diretor científico da FAPESP, Carlos Henrique de Brito Cruz, em entrevista ao Jornal da USP. Entre os resultados científicos de maior destaque do programa, segundo ele, estão as previsões de aumento do nível do mar no litoral paulista e a caracterização dos chamados “rios voadores” da Amazônia, que levam umidade da floresta para outras regiões do Brasil.
Ainda assim, mesmo após uma década de pesquisa, ainda há muitas lacunas a serem preenchidas. Razão pela qual centenas de pesquisadores se reuniram recentemente na sede da Fapesp, para fazer uma reflexão sobre a primeira década do programa e, em cima disso, iniciar um processo de revisão e planejamento de prioridades para os próximos dez anos.
Além da necessidade de aprofundar o conhecimento científico sobre diversos fenômenos naturais ligados às mudanças climáticas, um dos principais desafios identificados pelos pesquisadores na reunião foi a necessidade de uma melhor comunicação com a sociedade (e com seus atores econômicos e políticos) sobre os riscos e os impactos associados a essas mudanças – principalmente no que diz respeito aos impactos locais e sociais, que afetam diretamente a vida das pessoas.
“Vocês acham que alguém vai mudar seu estilo de vida por causa do urso polar?”, desafiou o médico Paulo Saldiva, Diretor do Instituto de Estudos Avançados (IEA) e Professor da Faculdade de Medicina da USP. Segundo ele, a ciência precisa inovar na forma de se comunicar com a sociedade sobre o tema das mudanças climáticas, apostando em narrativas que combinem desafios globais com benefícios locais e individuais. Por exemplo, destacando os efeitos da poluição urbana sobre a saúde pública. “As pessoas mudam de comportamento mais quando vão para a UTI do que para a igreja”, disse. “Temos que fazer a mensagem chegar no cidadão, se não vamos continuar sempre pregando para convertidos”.