Novos mapas revelam que blocos de petróleo e gás se sobrepõem a 183 milhões de hectares de florestas tropicais na Amazônia, Bacia do Congo e Sudeste Asiático
Mais de 70 organizações internacionais presentes na COP 30 divulgaram dia 17 de novembro uma carta aberta conclamando os governos de todo o mundo a estabelecer zonas de exclusão livres de combustíveis fósseis para proteger florestas de alta integridade e garantir os direitos dos Povos Indígenas e comunidades locais. O apelo ocorre enquanto novos mapas mostram a sobreposição de blocos de petróleo e gás em mais de 183 milhões de hectares de florestas tropicais na Amazônia, Região do Congo e Sudeste Asiático — uma ameaça que exige ação imediata nesta “COP das Florestas”. (Os mapas podem ser baixados aqui.)
Uma ampla diversidade de organizações assinou a carta, incluindo entidades dedicadas ao clima, natureza, direitos humanos e povos indígenas, como: Amazon Watch, Anistia Internacional, Center for International and Environmental Law (CIEL), ClimaInfo, Earth Insight, Fossil Fuel Treaty, Global Alliance of Territorial Communities (GATC), Global Witness, Greenpeace, LINGO, Parliamentarians for a Fossil Free Future, Oil Change International e Stand.Earth. A carta completa e a lista de signatários estão disponíveis aqui.
A COP 30, realizada no coração da Amazônia, em Belém, representa um momento crítico para a proteção das florestas. Como destacou o presidente Lula na abertura da conferência, “os olhos do mundo se voltam para Belém com imensa expectativa”. A carta das organizações responde ao chamado de Lula por roteiros que revertam o desmatamento e superem a dependência de combustíveis fósseis, oferecendo um primeiro passo concreto: impedir a expansão fóssil nos ecossistemas florestais mais importantes do planeta. Novas organizações continuam assinando a carta aberta.
“Há um passo inicial óbvio para implementar esse chamado: precisamos parar a expansão dos combustíveis fósseis em florestas de alta integridade para evitar estradas, oleodutos e infraestrutura que inevitavelmente acompanham a exploração, levando ao desmatamento e à violação dos direitos dos Povos Indígenas e comunidades locais que protegem esses ecossistemas há gerações”, destaca a carta.
A urgência é evidente. As florestas tropicais absorvem cerca de um quarto de todo o CO₂ emitido anualmente, armazenando enormes quantidades de carbono em árvores e solos. No entanto, a exploração de petróleo e gás ameaça 21% das florestas tropicais de alta integridade nas três regiões críticas (de acordo com a definição de Vancutsem et al., 2021). Declarar reservas comprovadas de petróleo, gás e carvão localizadas sob florestas tropicais e subtropicais como áreas proibidas poderia evitar a liberação de 317 bilhões de toneladas de CO₂ — 1,3 vez maior que o orçamento de carbono restante para 1,5°C.
“Devemos pôr fim ao avanço da indústria fóssil sobre florestas de alta integridade, que atuam como barreiras contra o colapso climático, e garantir os direitos dos Povos Indígenas e comunidades locais, cujo conhecimento ancestral é a forma mais eficaz de conservação.”
O que está em jogo nas três maiores regiões de florestas tropicais
A análise publicada hoje mostra que blocos de petróleo e gás se sobrepõem a florestas de alta integridade em três regiões essenciais, colocando em risco alguns dos maiores sumidouros de carbono do planeta. A expansão fóssil costuma ser a porta de entrada para o desmatamento, pois estradas abertas em florestas intactas costumam ser o “primeiro corte”, desencadeando uma espiral de degradação que pode se estender por mais de 10 km. A exploração de petróleo e gás também prejudica a saúde de povos indígenas e comunidades locais, contaminando rios com derramamentos e o ar com a queima de gás.
Principais resultados por região (a partir dos novos mapas):
Região Amazônica
- A Amazônia se aproxima de um ponto de inflexão impulsionado pela expansão industrial.
- 74 milhões de hectares (14%) de florestas de alta integridade e
31 milhões de hectares (12%) de terras de povos indígenas e comunidades locais
se sobrepõem a blocos de petróleo e gás. - A expansão de indústrias extrativas é especialmente preocupante para Povos Indígenas em isolamento voluntário e contato inicial (PIACI).
- No Peru, blocos de petróleo e gás sobrepõem 21% das reservas PIACI existentes e propostas.
Região do Congo
- A Bacia do Congo perde 3,9 milhões de hectares de floresta por ano.
- Uma moção recente da IUCN pede que os governos mantenham pelo menos 74% das florestas intactas e proíbam indústrias extrativas nas áreas mais pristinas.
- Ainda assim, 72,5 milhões de hectares (40%) das florestas de alta integridade e
38% das florestas comunitárias já estão sobrepostos por blocos de petróleo e gás.
Sudeste Asiático
- A expansão extrativa continua erodindo a biodiversidade.
- 14% das Áreas-Chave de Biodiversidade (KBAs) e
36,8 milhões de hectares (37%) das florestas de alta integridade
estão sob concessões de petróleo e gás.
Cresce o movimento global por florestas livres de combustíveis fósseis
A carta se soma a um movimento global crescente. Plataformas lideradas por Povos Indígenas já pediram a exclusão de combustíveis fósseis de seus territórios, e organizações da sociedade civil pressionam para defender o Caribe, o Triângulo de Corais e Áreas Protegidas.
Recentemente, países participantes do Congresso Mundial de Conservação da IUCN 2025 ampliaram o apoio a uma Amazônia livre de combustíveis fósseis para incluir a Bacia do Congo e solicitaram à Comissão Mundial de Direito Ambiental que avalie um Tratado de Não-Proliferação de Combustíveis Fósseis.
Na Amazônia, projetos de lei coordenados foram apresentados no Brasil, Colômbia, Peru, Equador e Bolívia para proibir a expansão fóssil. A Colômbia declarou a Amazônia como Zona de Recursos Naturais Renováveis, proibindo novas extrações de petróleo e minerais — um exemplo que outros países podem seguir.
Uma transição justa exige ação imediata
A carta enfatiza que estabelecer zonas livres de combustíveis fósseis é fundamental para uma transição justa e pede que países desenvolvidos mobilizem os recursos necessários para compensar as nações em desenvolvimento e implementar essas zonas.
A conclusão reforça:
“O presidente Lula abriu a COP 30 lembrando que ‘os olhos do mundo se voltam para Belém com imensa expectativa’. Mas não haverá proteção florestal nem transição justa se não interrompermos o avanço da indústria fóssil sobre as florestas e seus guardiões. Frear essa expansão e garantir meios de implementação seria um primeiro passo ousado. O mundo observa. Povos Indígenas, comunidades locais e as futuras gerações contam com todos nós.”



