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Barqueata da Cúpula dos Povos leva mais de 200 embarcações à Baía do Guajará, em Belém, em ato histórico pela Amazônia e pela justiça climática

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Lúcia Chayb Diretora eco21.eco.br @eco21_oficial @luciachayb luciachayb@gmail.comPor trinta anos foi a jornalista responsável pela revista ECO21 (1990/2020)

Cerca de 5 mil pessoas de 60 países são esperadas para percorrer os rios que cercam a capital da COP30 em um grandioso ato político sobre as águas. Uma das embarcações trará lideranças como Raoni na “Caravana da Resposta”.

 No próximo 12 de novembro, a partir das 9h da manhã, mais de 200 embarcações transportando cerca de 5 mil pessoas devem se reunir na Baía do Guajará, em frente à capital paraense, em um dos momentos mais simbólicos da Cúpula dos Povos, evento paralelo à COP30. A Barqueata da Cúpula reunirá caravanas que partiram de outros municípios, Estados e países para denunciar falsas soluções climáticas e anunciar que a resposta para um mundo sustentável é o povo das águas, das florestas e das periferias que resiste com suas práticas coletivas, agroecológicas e ancestrais. 

A barqueata começará na Universidade Federal do Pará (UFPA), território da Cúpula dos Povos, e seguirá margeando o rio Guamá que depois vira rio Guajará para chegar até a Vila da Barca, área de palafitas que é um enclave social, pois, parte das moradias vive sem nenhum saneamento. São décadas de resistência dos moradores à especulação imobiliária e falta de atenção do poder público.

Na preparação da cidade para a COP 30, a Vila da Barca receberia uma estação de tratamento do esgoto de bairro de classe média embelezado nos últimos meses para compor a paisagem turística. Assim, a área tornou-se um exemplo das contradições das conferências que tomam decisões equivocadas, ignorando os mais impactados pelos eventos climáticos extremos.

Essas contradições serão expostas em faixas, cartazes que ornamentarão barcos de grande e pequeno porte em um percurso de 7 milhas náuticas. A expectativa é sair de quatro portos próximos à UFPA e navegar por cerca de duas horas, tempo médio que leva em consideração a força da maré. 

“Estamos alinhados e achamos que vai ser histórico!”, diz Iury Paulino, membro da Comissão Política da Cúpula dos Povos e coordenador do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB). O barramento dos rios está entre as ações corporativas e infraestruturas denunciadas por causarem impactos que cada vez mais contribuem para a crise climática como mudança no curso das águas, assoreamentos, extinção de espécies, inundações de áreas que antes eram de floresta e expulsão de comunidades guardiãs de práticas de preservação.

Esses impactos também são enfrentados pelos pescadores que mantém histórica relação cultural com o mar. Ribeirinhos e pescadores de todo o mundo sofrem diretamente com as contaminações dos rios e áreas costeiras causadas pela exploração mineral e pelos vazamentos de produtos químicos. No Brasil, os rompimentos das barragens da Vale em Mariana (2015) e Brumadinho (2019) provocaram centenas de mortes, destruição de comunidades e graves danos ambientais, contaminando rios e ecossistemas. No Equador, o rompimento do oleoduto SOTE, operado por uma estatal, fez vazar petróleo no Esmeraldas River, em março de 2025, e despejou mais de 25.000 barris de crude, contaminando água potável, rios e comunidades costeiras.

Por isso, os movimentos e organizações da Cúpula dos Povos se unem para fazer ecoar sobre as águas o grito de denúncia contra decisões da COP que mantém esse modelo de exploração dos territórios. E contra as corporações que atuam fortemente nos espaços de decisão das Conferências para impedir que metas mais ousadas de redução da exploração dos bens naturais, mitigação e reparação dos danos estejam definidas nas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs), que são as metas de cada país para reduzir emissões de gases de efeito estufa e se adaptar às mudanças climáticas, conforme estabelecido no Acordo de Paris.

Raoni – Entre os barcos confirmados para a barqueata está a Caravana da Resposta, mobilização que percorre mais de 3 mil quilômetros entre Sinop (MT) e Belém (PA) com mais de 300 lideranças indígenas, ribeirinhas, quilombolas e camponesas. Com o apoio da Cúpula dos Povos, a mobilização organizada pela Aliança Chega de Soja, articulação com cerca de quarenta organizações brasileiras e internacionais, saiu de Santarém neste domingo, 09.

A Caravana refaz o caminho do chamado “corredor da soja”, denunciando os impactos do agronegócio e das grandes obras de infraestrutura — como a Ferrogrão e as hidrovias do Arco Norte — sobre territórios e modos de vida tradicionais. A Ferrogrão é um projeto de ferrovia de 933 km planejada para ligar Sinop (MT) a Miritituba (PA), com o objetivo de escoar grãos (principalmente soja e milho) do Centro-Oeste brasileiro pelo Arco Norte. Mas a sua execução ameaça unidades de conservação, terras indígenas e intensifica o desmatamento na Amazônia.

Durante o ato, devem embarcar lideranças históricas da luta indígena no Brasil, como o cacique Raoni Metuktire, a liderança Alessandra Korap Munduruku e representantes dos povos Kayapó, Panará, Borari, Tupinambá, Xipaya, Arapiun, Huni Kuin e Kayabi, entre outros. A presença desses líderes simboliza o elo entre os povos do Xingu e do Tapajós, regiões onde o avanço da soja e da infraestrutura de exportação tem causado destruição ambiental e violações de direitos.

Foto: RAFAEL VILELA

“Os povos são a resposta”

Pedro Charbel, da Aliança Chega de Soja, disse que a Caravana sintetiza o que o movimento chama de denúncia e anúncio. “A nossa luta é contra esses portos corporativos, contra as hidrovias e contra a Ferrogrão, mas a gente também tem a resposta. A resposta é a agroecologia, é a comida boa sem veneno, é a solidariedade com o povo, são as cozinhas solidárias, é a distribuição de comida de graça porque comida é direito, não é mercadoria. A resposta é a infraestrutura que vem do povo e não a que beneficia bilionários do agronegócio. A resposta são os territórios vivos, as terras demarcadas, a floresta em pé e o rio limpo, com peixe saudável — não o rio contaminado de mercúrio e soja.”

A Cúpula dos Povos, que reúne mais de 1,2 mil movimentos, organizações e redes do Brasil e do exterior, reforça que a Barqueata representa o espírito da conferência. “Não é só um ato, é um manifesto fluvial. As águas da Amazônia estão trazendo as vozes que o mundo precisa ouvir: as de quem defende a vida, os territórios e o clima”, afirma Lider Gongora, membro da Comissão Política da Cúpula dos Povos, ativista equatoriano, delegado dos Povos do Mangue e do Mar (World Forum of Fisher Peoples – WFFP).

“Quando os povos de várias regiões navegam juntos, o mundo precisa parar para ouvir. Esta é uma mensagem global: os povos que protegem a floresta, os rios, o mar e o mangue são a resposta mais concreta e corajosa à crise climática”, destaca Lider.

Fot: RAFAEL VILELA

Rumo a Belém

A Caravana da Resposta, uma das principais participantes da Barqueata, partiu de Santarém (PA) no dia 8 de novembro, após 5 dias de jornada desde o Sinop (PA). A embarcação traz alimentos agroecológicos produzidos por agricultores familiares e indígenas que serão utilizados na cozinha solidária da Cúpula dos Povos durante os dias de conferência.

Outras caravanas e movimentos sociais que percorrem o país também chegarão a Belém para se somar à Barqueata, tornando o ato uma grande convergência fluvial da sociedade civil rumo à COP30.

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